Como funciona a dosimetria da pena? – art. 68 do CP

1 – O Código Penal e o chamado sistema trifásico

dosimetria da pena

Você já se perguntou como o juiz chega ao quantum da sanção, ou melhor, da pena cominada na sentença? Não é um número aleatório ou simplesmente “jogado”. Existe uma “fórmula”, um sistema para a formulação da dosimetria da pena.

Os tipos penais preveem penas mínimas e máximas, bem como causas de “aumento de pena” e causas de “diminuição de pena”, sem falar nas eventuais agravantes ou atenuantes genéricas de pena.

Como dito, existe um sistema para se definir qual será a pena cabível, não bastando que se comine o mínimo ou o máximo legal.

A sanção do tipo “pena” deve ser aquela que a situação recomendar, sob pena de ser injusta (caso excessiva ou insuficiente). Não existe justiça na desproporcionalidade (seja para mais ou menos).

Este sistema está inserto em nosso Código Penal (CP) e ficou conhecido como sistema trifásico de dosimetria da pena, sendo que é através deste que o Meritíssimo Juiz chegará a pena suficiente e necessária para reprimir a conduta, reparar o dano e ressocializar o infrator.

Bem, é o que veremos a seguir. Boa leitura.

2 – Como funciona a dosimetria da pena – art. 68 do CP

dosimetria da pena

Caso não tenha familiaridade com o direito penal, processo penal e, sobretudo, com uma sentença de natureza criminal, destacamos que a condenação por um crime pressupõe (como regra) a cominação de uma sanção penal do tipo “pena”.

As penas permitidas no direito brasileiro, são (art. 32 do CP): privativas de liberdade, penas restritivas de direitos e de multa.

“Art. 32 – As penas são: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I – privativas de liberdade;

II – restritivas de direitos;

III – de multa.”

Assim, ante uma condenação criminal, através de um decisum condenatório de natureza criminal, o juiz, necessariamente, deverá lançar mão do chamado sistema trifásico de dosimetria da pena para chegar a pena correta para aquele caso.

O fundamento de um sistema com critérios mais objetivos de dosimetria é, basicamente, evitar arbitrariedades.

O objetivo é limitar a discricionariedade do julgador no momento de se cominar a pena, isto é, na dosimetria desta.

De início, destacamos que a previsão legal para o sistema trifásico de dosimetria da pena está esculpida no art. 68 do CP. Vejamos:

sistema trifásico de dosimetria da pena

Art. 68 – A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Parágrafo único – No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

Portanto, a dosimetria da pena comporta 03 (três) fases distintas, definidas como:

    • Pena-base (1ª fase)

    • Pena intermediária (2º fase)

    • E a pena final (3º fase)

No momento da cominação da pena, o Juiz deve enfrentar cada uma das etapas (fases), sob pena de tornar a sentença nula ou mesmo ensejar na sua readequação em sede de recurso.

3 – Fases da dosimetria da pena:

A seguir debateremos as 03 (três) fases da já referida dosimetria da pena. Vejamos:

3.1 – Pena-base: 1ª fase da dosimetria da pena: – circunstâncias judiciais – art. 59 do CP:

Como já mencionado acima, os crimes possuem uma pena mínima e uma pena máxima, o que significa dizer que, na primeira fase, não se permite que a pena-base fique aquém do seu mínimo legal ou além do seu máximo prescrito em lei.

Existe, portando, entre o mínimo e o máximo da sanção penal prevista, uma certa margem para discricionariedade que deve ser guiada com base no art. 59 do CP, que trazem as chamadas “circunstâncias judiciais”.

Vejamos o art. 59 do CP:

Art. 59 – O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

Quanto mais circunstâncias negativas, maior será a pena-base.

Exemplo: no delito de furto simples a pena mínima é de 01 anos. Se todas as circunstâncias judiciais insertas no art. 59 do CP forem neutras ou favoráveis, muito provavelmente a pena-base será cominada em seu mínimo.

3.1.1 – Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça – STJ:

É indispensável salientar que a pena-base não deverá exasperada (aumentada) pela mera existência de ações penais ou mesmo inquéritos policiais em curso, conforme entendimento extraído da súmula 444 do STJ:

Súmula 444 – É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base. (Súmula 444, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/04/2010, DJe 13/05/2010)”

3.2 – 2ª fase da dosimetria da pena: circunstâncias atenuantes (arts. 61 e 62 do CP) e circunstâncias agravantes (arts. 65 e 66 do CP):

Determinada a pena-base, conforme art. 59 do CP, agora será a vez de enfrentar a segunda fase da dosimetria da pena, a chamada fase intermediária da pena.

De outro modo, na segunda etapa, o juiz deverá verificar se concorrem causas agravantes (arts. 61 e 62 do CP) e/ou atenuantes de pena (arts. 65 e 66 do CP).

Conforme indicar a situação, a pena-base poderá ser agravada ou atenuada.

A confissão constitui causa atenuante da pena (art. 65, inciso III, alínea “d”, do CP), assim como a reincidência constitui agravante (art. 61, inciso I, do CP). São exemplos do que se convém denominar de atenuantes e agravantes genéricas.

3.2.1 – Como interpretar a súmula 231 do STJ?

Atente-se, que por força da súmula 231 do STJ, a pena, na fase intermediária, não poderá ficar aquém (abaixo) do seu mínimo legal.

Súmula 231 do STJ:

A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal.”

Assim, mesmo que pena-base seja fixada em mínimo legal e concorra mais de uma circunstância atenuante de pena, não será possível que a pena intermediária fique abaixo do seu mínimo legal.

Exemplo: agente “A” praticou o crime de furto simples. O agente confessou o crime. “A” foi condenado e a pena-base fixada em 01 (um) ano, ou seja, em seu mínimo. Na segundo estágio da dosimetria da pena, apesar da confissão, não se permitirá que a pena seja conduzida para menos do que 01 (um) ano, pois já é o mínimo legal.

3.3 – 3ª fase da dosimetria da pena: verificar a incidências das causas de aumento e de diminuição de pena – art. 68 do CP:

Por fim, no que diz respeito a terceira (e última fase) da dosimetria da pena, esta diz respeito, basicamente, as “causas de aumento de pena” e “causas de diminuição de pena”, conforma manda o art. 68 do CP.

São situações previstas em lei que podem diminuir (que é diferente de atenuar) a pena cominada ou exasperá-la (que é diferente de agravar).

É possível que uma causa (geral ou especial) possa diminuir a pena final para abaixo de seu mínimo legal, assim como uma causa de aumento pode exasperá-la para além do teto legal (GRECO, 2013, p. 563). Podemos citar como um exemplo típico de “causa de diminuição de pena” é o instituto do arrependimento posterior previsto no art. 16 do CP.

Alguns outros tipos penais podem comportar causas especiais de diminuição de pena. O furto privilegiado, o homicídio privilegiado e tráfico privilegiado são situações que comportam causas de diminuição de pena.

Verificado no caso concreto qualquer causa de diminuição de pena, esta será aplicada no terceiro estágio de dosimetria da pena e, de acordo com a situação, poderá conduzir a pena final para aquém de seu mínimo legal.

Exemplo: furto simples com pena-base fixada em seu mínimo, não concorreram causas atenuantes ou agravantes de pena, e foi reconhecida o arrependimento posterior (art. 16 do CP) que reduziu a pena 02 (dois) terços, ficando, no final, em 04 (quatro) meses.

4 – Ainda sobre a dosimetria e o cálculo de pena…

Em síntese, em hipótese de condenação, o Magistrado responsável deverá lançar mão do chamado “sistema trifásico” para determinar qual será o quantum de pena cabível a situação concreta.

A inobservância deste sistema e suas fases poderá acarretar em nulidade da sentença ou, pelo menos, em sua reforma.

Em caso de inconformismo com a dosimetria da pena ou mesmo de inobservância dos critérios legais e jurisprudenciais correlatos, a parte ofendida poderá recorrer através de recurso de apelação e, excepcionalmente, em hipótese de flagrante ilegalidade ou de uma decisão teratológica, será, em tese, cabível Habeas Corpus (se trata de exceção).

5 – Conclusão:

A dosimetria da pena está disciplinada no art. 68, do Código Penal, que institui o chamado sistema trifásico de dosimetria da pena, devendo ser observado, sob pena de nulidade ou de reforma da sentença com a readequação da pena. Observar o sistema trifásico é medida que se impõe.

Veja mais em:

Arquivamento do inquérito policial – art. 28, do CPP

Crime tentado (art. 14, inciso II, do CP)

O interrogatório do réu: último ato da instrução (art. 400 CPP)

Quais são os crimes hediondos (Lei 8.072/90)?

Petição para informar endereço do réu

Fontes:

Súmula 231 do STJ

Súmula 444 do STJ

Bibliografia:

GRECO, Rogério. CURSO DE DIREITO PENAL. -15. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013.

 

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