1 – Princípios do Processo Civil – CPC/15:
O atual Código de Processo Civil (CPC/15) traz em seu bojo uma extensa base principiológica, ou seja, um alicerce considerável de princípios processuais (implícitos e explícitos). Muitos desses princípios tem natureza constitucional, tendo sido repetidos no códex processual civil de 2015. Dentre esses, podemos citar o princípio do devido processo legal.
Atualmente, quando se fala em direito, qualquer que seja o ramo, nos deparamos com uma inseparável convergência entre as normas constitucionais e o ramo por ventura estudado.
O constitucionalismo, como movimento de constitucionalização do direito e do processo, atua como um agente catalisador para impor, melhor, para atrair para o direito material e direito processual, os princípios, regras e normas constitucionais, devendo que o processo siga e respeite as normas e direitos fundamentais (DONIZETTI, 2016, p. 26).
2 – Novo Código de Processo Civil:
Feitos os esclarecimentos acima, é possível depreender que o direito, o que inclui o direito processual civil, deve ser regido pelas normas constitucionais, independentemente de previsão na legislação ordinária ou lei complementar.
Sob tal premissa, o atual código de processo civil, ou seja, o CPC/15, trouxe diversos princípios em seu bojo.
Podemos citar, por exemplos, os princípios da cooperação, ampla defesa, contraditório e o da boa-fé processual (veja nosso artigo).
Dentre tais princípios, podemos citar, ainda, o princípio do devido processo legal, que será objeto deste post.
3 – Princípio do devido processo legal – art. 5, inciso LIV, da CF/88:
O código de processo civil de 2015 – CPC/15 não trouxe, de modo explícito, o princípio do “devido processo legal”. Contudo, seu fundamento é extraído diretamente da Constituição Federal de 1988 – CF/88, estando inserido no art. 5º, do inciso LIV, da Carta Maior. Vejamos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
Estando inserto no art. 5, da CF/88, o princípio do devido processo legal consiste em direito fundamental, possuindo, portanto, aplicação de caráter imediato.
O referido princípio se aplica a todo e qualquer ramo do direito, inclusive ao direito processual civil. Por óbvio, o mencionado princípio também se aplica ao processo administrativo.
4 – Princípio do devido processo legal:
Agora, adentrando no tema principal do presente post, abordaremos o princípio do devido processo legal sob a ótica do direito processual civil.
Para a doutrina mais relevante do direito processual civil, o devido processo legal atua como uma espécie de “norte”, uma bússola que tem como fim garantir um processo justo e coeso, não apenas no sentido de forma ou modo de tramitação, mas como garantia de um processo com resultado legítimo.
Nesse sentido, Elpídio Donizetti (2016, p. 36) leciona que o devido processo legal é um princípio “que garante o processo regido por garantias mínimas de meios e de resultado”. Portanto, deve ser interpretado como um verdadeiro direito/dever de que o processo, seja ele judicial ou administrativo, tenha uma tramitação adequada, previsível e justa.
5 – Devido processo legal material e formal:
O princípio do devido processo legal, de acordo com a doutrina moderna, deve ser entendido sob duas vertentes, sendo uma formal e outra material (DONIZETTI, 2016, p. 37).
Aspecto formal: basicamente é a ideia de que o processo deve seguir ritos preestabelecidos, previsíveis e regras já existentes. Digamos que não se pode “no curso do jogo” criar regras específicas para determinado caso ou adotar diretrizes diferentes para casos iguais.
Inclusive, Daniel Amorim (2018, p. 174) sustenta que o devido processo legal formal é associado a uma ideia de justeza em um processo com ampla participação das partes.
Aspecto material: quanto ao critério material (ou substancial), o devido processo legal argui que, mesmo considerando a existência de um aspecto formal com regras preexistentes, este deve ser materialmente palpável, no sentido de ser razoável, alcançável. De nada adianta criar regras que não podem ser alcançadas ou são desarrazoadas (DONIZETTI, 2016, p. 37).
No dizeres de Daniel Amorim (2018, p. 174), o devido processo legal material tem como fim específico evitar a “atividade legislativa abusiva e irrazoável”, o que engloba também uma interpretação da lei e das regras de forma razoável (Daniel Amorim, 2018, p.174).
6 – Jurisprudência sobre o princípio do devido processo legal:
Para o Supremo Tribunal Federal – STF, não pode ocorrer o cancelamento de registro em conselho sem que haja o devido processo legal. No caso, se trata de processo administrativo em conselho de classe:
REGISTRO PROFISSIONAL OU DE PESSOA JURÍDICA – INADIMPLEMENTO – PERDA – AUTOMATICIDADE.
É inconstitucional, sob o ângulo da liberdade fundamental do exercício da profissão e do devido processo legal, preceito normativo a versar previsão de cancelamento automático do registro em conselho profissional, ante a inadimplência da anuidade, ausente prévia oitiva do associado.
(RE 808424, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-105 DIVULG 29-04-2020 PUBLIC 30-04-2020).
A jurisprudência acima tem como finalidade expor que o devido processo legal é uma garantia de fundamental, que atua no sentido de assegurar a observância das regras existentes.
7 – Exemplo de violação do princípio do devido processo legal (caso fictício):
“Determinado indivíduo foi citado/intimado, no dia 26/08/2020, para comparecer em uma audiência de conciliação em razão de uma ação de cobrança, que se realizará no dia 28/08/2020”
No caso, qual a violação? Vimos em nosso artigo sobre a audiência de conciliação que o réu deve ser citado para comparecer a audiência com antecedência mínima de 20 (vinte dias), conforme art. 334, do CPC/15.
No caso, a violação consiste no exíguo prazo para comparecer na conciliação designada para apenas dois dias após a citação. Veja, no exemplo acima há nítida violação do devido processo legal formal e material.
Veja mais do nosso trabalho em:
Como identificar o assédio moral no ambiente de trabalho?
Direito Penal: desistência voluntária, arrependimento eficaz e arrependimento posterior
Modelo de pedido de penhora do salário na execução de alimentos – CPC/15
Bibliografia:
Donizetti, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. – 19. ed. revisada e completamente reformulada conforme o Novo CPC. – São Paulo: Atlas, 2016.
Neves, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Volume único. – 10ª ed. revista, ampliada e atualizada. – Salvador/BA: Juspodivm, 2018.