Iphone sem carregador configura venda casada – art. 39. CDC

Apple lança iphone sem carregador:

Recentemente a Apple anunciou o lançamento do Iphone 12, porém este viria sem carregador. Desse modo, a comunidade consumerista estranhou, o que é mais do que natural, afinal um celular sem carregador é no mínimo controverso. Dito isso, alguns questionamentos surgiram, sobretudo se a venda de Iphone sem carregador configura venda casada na legislação brasileira.

O Iphone 12 ainda não está disponível para venda no Brasil, porém a Apple já se antecipou no sentido de, por questões ambientais, retiraria o carregador dos seus próximos lançamentos, incluindo, nesse caso, o Iphone 12.

Ainda de acordo com a referida empresa, o mundo já está cheio de carregadores e isso justificaria a desnecessidade de introdução de novos acessórios do tipo, podendo, inclusive, que se aproveitasse carregadores existentes.

Então, qual o problema?

Pois bem, mesmo considerando a ausência do carregador, o maior problema é que o cabo de dados incluído na caixa é do tipo USB-C, em ambas as extremidades (pontas), ao contrário dos cabos do mesmo tipo existentes no mercado, que possui uma ponta USB-A e a outra USB-C. E mais, a esmagadora maioria dos carregadores tem uma entrada do tipo USB-A (a entrada mais comum).

Assim, para se usar o novo Iphone 12 o usuário deve, necessariamente, comprar um novo carregador, que poderia ter sido incluído na caixa do aparelho. Saliente-se, que a Apple também retirou os fones de ouvido.

O grande espanto é o fato de um Iphone, que possui valores bem acima da média, se comparado a outros aparelhos existentes no mercado com hardware semelhante, não incluir um acessório essencial para o funcionamento do aparelho (todo celular precisa ser recarregado).

Ainda não se sabe o valor oficial do Iphone 12, mas estima-se que a versão mais básica partirá de cerca de R$ 7.000,00 (sete mil reais), podendo chegar a R$ 14.000,00 (catorze mil reais).*preços meramente especulativos, não há garantia de que serão esses os valores*.

Percebe-se que mesmo na versão mais básica o valor é considerado altíssimo, principalmente se levarmos em conta que o valor do modelo atual, o Iphone 11 de 128 GB, parte de um preço médio de R$ 4.799,99 (quatro mil setecentos e noventa e nove reais e noventa e nove centavos)*preços aproximados, não há garantia de que se manterão*.

Feita essa introdução, agora adentraremos no cerne do post: Iphone sem carregador configura venda casada? Antes de mais nada, veremos o que é uma venda casada. Vejamos logo abaixo.

Venda casada (art. 39, inciso I, da Lei 8078/90): o que é?

venda casada

A venda casada é considerada ilícito consumerista, sendo expressamente vedada, conforme inciso I, do art. 39, da Lei 8078/90Código de Defesa do Consumidor (CDC). Vejamos:

“Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;”

Conforme artigo supra, a venda casada é, basicamente, “condicionar” a “venda” ou “fornecimento de produto ou serviço” ao “fornecimento” de “outro produto ou serviço”.

Um exemplo clássico de venda casada é o condicionamento de celebração de contrato de financiamento a aquisição de seguro somente em instituição indicada como forma de prosseguimento do negócio, sendo tal prática vedada, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.639.259-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 12/12/2018, DJe 17/12/2018).

Desse modo, limitar ou mesmo condicionar a oferta ou aquisição de serviço ou produto a compra ou aquisição de outro produto ou serviço configura a chamada venda casada.

Entendido isso, pergunta-se: o fato de a Apple ter retirado o carregador do novo Iphone 12 configura venda casada? Vejamos abaixo.

Iphone sem carregador configura venda casada (inciso I, do art. 39 CDC)?

Antes de tecer considerações sobre o assunto, devemos destacar que o Procon de São Paulo, conforme notícia veiculada no próprio site do órgão, notificou a Apple para que esta informe:

“– quais razões fundamentam a decisão comercial da empresa;

qual será o custo dos dispositivos ofertados em separado;

o que será disponibilizado para aquisição do consumidor para que seja efetuada a recarga e qual o tempo de previsão de carregamento do aparelho com o novo dispositivo;

se o consumidor tem alternativa para utilização de outros dispositivos com a mesma função;

como se dará o atendimento em garantia, já que os itens serão comprados em períodos distintos.”

Ainda não se tem notícia sobre o que a Apple respondeu, porém isso não nos impede de fazer algumas considerações sobre o assunto.

Para saber ou não se existe a venda casada neste caso em específico é necessário verificar se a ausência de carregador limita o pleno uso do aparelho. Em um primeiro momento nos parece que sim.

Caso, de fato, o Iphone 12 seja comercializado sem o carregador e considerando que o tipo de cabo de dados é o USB-C (nas duas pontas), se mostrará nítida a necessidade de aquisição de um produto (carregador) específico para poder carregar o aparelho.

E mais, não se sabe se existem produtos “paralelos” compatíveis com o produto (pelo menos sem danificá-lo a longo prazo), tornando, de modo indireto, o consumo inseguro ante a ausência de produtos certificados no mercado, além do carregador Apple que será vendido de forma separada.

Se tal cenário se confirmar, fica bastante nítida a possibilidade de se verificar a venda casada, uma vez que para que o aparelho funcione e seja utilizado no dia a dia, se mostra imprescindível a aquisição de um produto a mais (que todos os outros fabricantes já incluem).

A plena utilização do aparelho fica condicionada a aquisição de um carregador compatível com o USB-C.

E se o Procon-SP entender pela venda casada?

Nesse caso, o Procon-SP poderá adotar as medidas administrativas do art. 56, do CDC, incluindo multa pecuniária, além de tomar medidas judiciais cabíveis em caso de descumprimento. Claro que é perfeitamente possível a realização de acordo extrajudicial nesse sentido.

Verificada a ilegalidade, a Apple pode acordar no sentido de:

– Incluir o carregador compatível na caixa do novo Iphone 12;

– Trocar o cabo de dados para um formato compatível para o mercado e demais carregadores, sobretudo para os modelos já existentes da própria Apple;

– Oferecer desconto proporcional no produto;

– Ou outra medida apta a sanar o prejuízo;

Não obstante, caso verificada a ilegalidade e a Apple persistir na conduta, é possível a proposição de Ação Coletiva para garantir e resguardar os direitos dos consumidores (direitos individuais homogêneos), nos moldes do art. 81, do CDC, pelos legitimados do art. 82, do CDC em face da Apple.

Lembrando, que tudo isso ocorrerá apenas se restar verificada a ilegalidade na conduta. Pode ser que tanto o Procon-SP, bem como os demais legitimados do art. 82, do CDC (o que inclui o Ministério Público) entendam que não há ilegalidade na conduta de vender o carregador de forma separada.

Qual a sua opinião sobre o assunto? Configura ou não venda casada?

Estaremos atentos ao imbróglio e postaremos atualizações aqui! Obrigado pela leitura.

➜ Atualização: No dia 02/12/2020 o Procon-SP publicou nota afirmando que irá exigir que a Apple forneça carregador aos consumidores que solicitarem. E mais, também informou que submeterá a conduta da empresa ao órgão de fiscalização para verificar se cabe multa em face da conduta.

➜ Atualização: No dia 19/03/2021 foi noticiado em diversos veículos de comunicação que o Procon-SP multou a Apple em pouco mais de R$ 10,5 milhões de reais pela venda de Iphone sem adaptador de energia (carregador), além de outras condutas, conforme se vê AQUI, AQUI e AQUI.

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