1 – Defesa prévia tráfico de drogas: peculiaridades, teses e modelo
A defesa prévia no tráfico de drogas possui certas peculiaridades que merecem a devida atenção.
Como bem sabemos, no Processo Penal, independente do delito que se apura, é indispensável que se perfectibilize o contraditório e ampla defesa.
O procedimento de exercício da persecução penal e materialização da defesa, está disciplinado no Código de Processo Penal – CPP.
Contudo, alguns tipos de delitos possuem procedimentos próprios, como ocorre com o delito de tráfico de drogas.
O crime de tráfico atualmente é previsto na Lei 11.343/06, que também regula aspectos processuais.
Portanto, é uma legislação de natureza mista, pois versa sobre direito material e processual.
Isto posto, quando se referir ao tráfico de ilícitos, é o mesmo que dizer que o seu processamento e persecução será feito à luz da Lei 11.343/06 e de forma subsidiária, será aplicado pelo CPP – é o que se extrai do art. 48 da Lei 11.343/06.
Feitos tais esclarecimentos, destacamos que neste post apresentaremos um modelo de defesa prévia de tráfico de drogas, abordando eventuais teses que poderão ser arguidas no seu caso.
Não temos como intuito o esgotamento do tema ou mesmo apresentar todas as teses possíveis, mas apenas aqueles mais recorrentes.
2 – Defesa prévia x Resposta à acusação
De início destacamos que nos feitos criminais que buscam a persecução dos crimes de tráfico, o nome correto da peça defensiva é “defesa prévia”.
Sim, no delito de tráfico de ilícitos de entorpecentes, a primeira manifestação defensiva do réu no processo se denomina de “defesa prévia”, cujo fundamento é o art. 55 da Lei de Drogas. Vejamos:
“Art. 55. Oferecida a denúncia, o juiz ordenará a notificação do acusado para oferecer defesa prévia, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.
§ 1º Na resposta, consistente em defesa preliminar e exceções, o acusado poderá argüir preliminares e invocar todas as razões de defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas que pretende produzir e, até o número de 5 (cinco), arrolar testemunhas.”
No procedimento comum previsto no CPP, o fundamento da resposta à acusação são os arts. 396 e 396-A do CPP.
Naturalmente, que as matérias dos arts. 395 e 397 do CPP podem ser perfeitamente utilizadas na peça defensiva no crime de tráfico.
Em síntese, a manifestação defensiva inicial do réu no procedimento de apuração de crime de tráfico de entorpecentes é “defesa prévia” – art. 55 da Lei 11.343/06.
3 – Teses de defesa de tráfico de drogas
Já escrevemos uma publicação sobre a resposta à acusação e as teses dos arts. 395 e 397 do CPP – veja aqui – e todas elas cabem na defesa do delito de tráfico, sejam as preliminares ou hipóteses de absolvição sumária.
No que se refere ao tráfico de drogas, a tese mais corriqueira é, provavelmente, a desclassificação do crime de tráfico para o crime de consumo de drogas (art. 28 da Lei de Drogas).
Em síntese, a defesa no tráfico podem ser de mérito ou mesmo processual:
Processuais: preliminares do art. 395 do CPP, incompetência do juízo, nulidades (art. 564 do CPP).
Mérito: desclassificação para o crime de consumo de drogas; confissão do delito; negativa de autoria; absolvição sumária (art. 397 do CPP – no que for cabível), reconhecimento do tráfico privilegiado e aplicação da pena em seu mínimo legal.
Esteja atento ao seu caso para sempre alegar a melhor tese defesiva possível.
Alguns causídicos preferem não se manifestar sobre o mérito de imediato, se limitando a uma resposta à acusação genérica e deixar para arguir as teses de mérito somente em alegações finais, o que pode não ser o melhor caminho – muito cuidado.
4 – Caso fictício – meramente exemplificativo – de defesa prévia de tráfico de drogas
“A”, brasileiro, solteiro, agricultor, portador do RG de nº xxxxx e CPF de nº xxxxxx, residente na Rua XXX, nº xxxx, bairro XXXX e Cidade/UF.
No dia XXX de XXXX de XXX, “A” foi preso em flagrante pela suposta prática de tráfico de drogas, pois trazia consigo 50g de uma substância de coloração branca, que foi definida como sendo cocaína pela autoridade policial.
O flagranteado admitiu a posse de drogas, mas afirmou que se seria para consumo pessoal.
O auto de prisão em flagrante foi remetido para autoridade judicial, que entendeu pela concessão de liberdade provisória ao flagranteado, pois este gozava de bons antecedentes, primariedade e emprego fixo.
A substância apreendida foi remetida para perícia.
Foi oferecida denúncia em face de “A” pela prática de crime de tráfico de drogas – art. 33 da Lei de Drogas.
Não foi anexado prova pericial da substância confiscada que demonstre que sua natureza é ilícita, isto é, proibida pela lei de drogas
“A” foi citado para apresentar defesa prévia.
Síntese das teses que poderão ser arguidas, conforme o caso fictício exposto acima.
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Nulidade pela não juntada prova pericial afirmando que a substância era de fato droga;
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Ausência de justa causa – ausência de materialidade;
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Desclassificação para o delito de porte de drogas para consumo pessoal – art. 28 da Lei de Drogas;
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Aplicação da pena em seu mínimo legal;
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Aplicação do tráfico privilegiado;
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Muito embora algumas teses pareçam conflitantes, é plenamente possível a alegação subsidiária destas.
5 – Modelo de defesa prévia de tráfico de drogas – art. 55 da Lei 11.343/06
Abaixo segue um modelo de prévia de tráfico de drogas, que consistirá, basicamente, na alegação de preliminares e, no mérito, a desclassificação do crime de tráfico para o delito de porte de drogas para uso pessoal e, subsidiariamente, a aplicação da pena em seu mínimo legal com o reconhecimento da causa de diminuição de pena do § 4º, do art. 33 da Lei de Drogas (tráfico privilegiado).
EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(ÍZA) DE DIREITO DA _____ VARA CRIMINAL DA COMARCA DE _______/UF Atenção ao endereçamento.
PROC. DE Nº XXXXXXXXXXXX – AÇÃO PENAL
DEFESA PRÉVIA – ART. 55 DA LEI 11.343/06
NOME DO RÉU, já devidamente qualificado (verificar a qualificação feita pelo MP – caso incorreta, faça a correção) nos autos do processo criminal em epígrafe, vem, com o devido respeito e superior acatamento, através de seu Advogado (procuração anexa), perante Vossa Excelência, apresentar DEFESA PRÉVIA, conforme art. 55 da Lei 11.343/06 e artigos 396 e 396-A, ambos do Código de Processo Penal, em conformidade com as alterações da Lei 11.719/08, pelos motivos, fundamentos e fatos a seguir delineados.
I – SÍNTESE DOS FATOS
Narrar os fatos de modo objetivo, claro e conciso. Narre tudo que for relevante para defesa. Neste exemplo, utilizaremos o exemplo fictício acima para melhor ilustrar o modelo.
II – PRELIMINARMENTE
II. I – DA FALTA DE JUSTA CAUSA PARA PELA AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE – ART. 395, INCISO III, DO CPP
Conforme inciso III, do art. 395 do CPP, constitui ausência de justa causa para a persecução do feito quando ausentes, mesmo que minimamente, indícios de autoria e materialidade.
No caso em tela, há fundada dúvida quanto a ausência de justa causa, pois não consta nos autos o laudo (definitivo ou preliminar) de perícia da substância confiscada com o defendente, motivo pelo qual o presente feito não deve prosseguir, pois não existe materialidade comprovada, mesmo que minimamente.
Assim, roga-se, pela rejeição da presente denúncia por ausência de justa causa pela nítida inexistência prova de materialidade, conforme inciso III, do art. 395 do CPP.
II. II – AUSÊNCIA DE JUNTADA DE LAUDO PERICIAL – NULIDADE – ART. 564 – INCISO III, ALÍNEA “b”, DO CPP
Inicialmente, a defesa roga pelo reconhecimento da nulidade do feito pela ausência de laudo pericial que ateste a materialidade do tóxico, conforme alínea “b”, do inciso III, do art. 564 do CPP.
Quando se fala oferecimento de denúncia pelo crime de tráfico de drogas é imprescindível a juntada de laudo pericial, constituindo, em verdade, requisito essencial para demonstrar a materialidade do ilícito ora apurado.
No caso em tela, sequer fora realizado laudo preliminar e até o momento não foi realizada a juntada do laudo definitivo. No caso, é indubitável que o oferecimento de denúncia sem que se anexe laudo, mesmo que preliminar, constitui nulidade indiscutível que põe em dúvida a sobriedade do feito e a integridade de sua persecução, nos termos da alínea “d”, do inciso III, do art. 564 do CPP.
Roga-se, desde logo, pelo reconhecimento da nulidade e, caso não seja sanado o vício, que o presente feito seja rejeitado, por ausência de materialidade, com fulcro no inciso III, do art. 395 do CPP.
III – DO MÉRITO (alegar toda matéria que for pertinente ao mérito da demanda)
III. I – DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS PARA O CRIME DEPORTE DE DROGAS PARA USO PESSOAL
Não obstante os pleitos feitos acima, o defendente roga, no mérito, pela desclassificação da acusação de tráfico de drogas, previsto no art. 33 da Lei de Drogas, para o delito de uso de drogas esculpido no art. 28 da mesma legislação.
No caso em tela, inexiste qualquer indicativo fático que aponte para a prática de tráfico de entorpecentes. A diferença entre a figura típica do art. 33 e aquela do art. 28 da Lei 11.343/06, basicamente é a finalidade a qual se destina o ilícito.
No caso do tráfico, seu intento é a distribuição, o repasse da droga para fins de se fazer circular o ilícito, enquanto que ilícito do art. 28 da Lei de tóxicos tem como fim o uso pessoal, apenas.
A distinção entre tais condutas pode ser analisada a partir da presença de outros elementos como a quantidade da droga, por exemplo. (coloque uma jurisprudência atualizada ou mesmo doutrina que verse sobre a diferença entre tráfico e porte para consumos)
Feitos tais esclarecimentos, percebe-se que a quantidade da matéria confiscada com o defendente é ínfima e incapaz de fazer presumir pela prática de tráfico de drogas.
Ante tudo que fora debatido, roga-se pela desclassificação do crime tráfico de entorpecentes para o delito de porte de drogas para consumo próprio (art. 28 da Lei de Drogas).
III. II – DA APLICAÇÃO DA PENA EM SEU MÍNIMO LEGAL E RECONHECIMENTO DO TRÁFICO EM SUA MODALIDADE PRIVILEGIADA
Na remota hipótese de eventual condenação pelo crime de tráfico de drogas, roga-se desde logo pela de eventual pena em seu mínimo legal, com o reconhecimento do crime de tráfico privilegiado (§ 4 º, art. 33 da Lei de Drogas).
Obs.: você deve desenvolver melhor este tópico, mas a cominação da pena em seu mínimo e reconhecimento do tráfico privilegiado depende da apuração das circunstâncias judiciais do defendente, que serão apuradas na instrução.
IV – DOS PEDIDOS
Ante o exposto, roga-se (os pedidos devem ser feitos na ordem de arguição):
I – Roga-se pela rejeição da denúncia pela ausência de justa causa, uma vez que não foi anexado aos autos prova da materialidade do delito, conforme inciso III, do art. 395 do CPP;
II – De modo alternativo, requer o reconhecimento da nulidade do presente feito pela inexistência de laudo pericial que ateste a materialidade da substância confiscada, com base na alínea “d”, do inciso III, do art. 564 do CPP;
III – No mérito, roga-se, desde logo, pela desclassificação do crime de tráfico de drogas para o delito de porte de drogas para uso pessoal, previsto no art. 28 da Lei de Drogas;
IV – De modo subsidiário, requer que, ao final e em caso de condenação, que seja aplicado ao réu a pena em seu mínimo legal e o reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no § 4º, do art. 33 da Lei de Drogas.
Nestes termos, pede e espera deferimento.
Comarca/UF, data.
Advogado
OAB/UF nº XXXXXX
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