Lei 14.126/2021: visão monocular como deficiência

1 – A visão monocular como deficiência e a Lei 14.126/2021:

visão monocular como deficiência

Foi publicada e sancionada a Lei 14.126/2021, que passou a considerar a chamada “visão monocular como deficiência visual”.

No caso, a lei equiparou a visão monocular a existência de deficiência em todos os seus efeitos e fins legais.

Inicialmente, vejamos a redação da referida lei.

Art. 1º Fica a visão monocular classificada como deficiência sensorial, do tipo visual, para todos os efeitos legais.

Parágrafo único. O previsto no § 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), aplica-se à visão monocular, conforme o disposto no caput deste artigo.”

A redação do texto legal em si é bastante simples, porém muito significativa. De modo direto, o art. 1º, da Lei 14.126/2021, determina que se “classifica”, ou seja, “se qualifica” como “deficiência visual” a chamada visão monocular.

Agora, conforme Lei 14.126/2021, a visão monocular é tida como deficiência, fazendo jus a todas a eventuais benesses e direitos que lhe garantam superar ou ao menos reduzir as barreiras.

Visão monocular, por sua vez, é o que se compreende como a cegueira (ausência de visão) em um dos olhos, apenas (podendo ser total ou parcial, conforme avaliação).

Não obstante, o parágrafo único, do art. 1º, da Lei 14.126/2021, entende nas hipóteses de visão monocular será possível que o Poder Executivo possa criar meios e instrumentos com o fito de se avaliar o grau e extensão da visão monocular, nos moldes em que ocorre nos demais casos para fins de aferição, por exemplo, do grau de impedimento das funções, limitação do desempenho das atividades e outros (art. 2º, § 1º do Estatuto da Pessoa com Deficiência).

2 – Acerca da concepção de pessoa com deficiência – conforme Estatuto da Pessoa com Deficiência:

Diversos doutrinadores se debruçam acerca do “conceito” de deficiência, porém a própria legislação se ocupou de definir sua concepção.

Portanto, conforme estabelecido em legislação (Estatuto da Pessoa com Deficiência), entende-se como deficiência aqueles impedimentos de longo prazo, conforme art. 2º, do citado estatuto. Vejamos:

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

Portanto, para que alguém seja reconhecido como pessoa com deficiência (PCD) será necessário que seu (seus) impedimento(s), sejam eles de “natureza física, mental, intelectual ou sensorial”, em relação as barreiras ora existentes (uma ou mais), limitem a plena (e efetiva) participação do indivíduo em sociedade, colocando o agente possuidor de limitações em uma situação de desigualdade de condições em detrimento dos demais membros.

3 – Sobre as barreiras – art. 3º, do Estatuto da Pessoa com Deficiência:

Sobre as “barreiras” de que fala o art. 2º, do Estatuto da Pessoa com Deficiência, diz respeito a existência de “entrave, obstáculo, atitude ou comportamento”1 que venham a restringir (ou mesmo impedir) a efetiva participação do indivíduo, além de outras delimitações.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência também traz o conceito de “barreiras”. Vejamos:

visão monocular

Art. 3º Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se:

I – […]

IV – barreiras: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros, classificadas em:”

O Estatuto da Pessoa com Deficiência vai além e define que as barreiras podem ser (art. 3º, inciso IV, alíneas “a” a “f”): urbanísticas, arquitetônicas, barreiras nos transportes, nas comunicações, atitudinais e tecnológicas.

4 – Natureza da cegueira monocular:

Conforme vimos acima, a cegueira monocular deve ser entendida como deficiência para todos os seus efeitos.

A própria Lei 14.126 de 2021 a classifica como deficiência do tipo sensorial.

5 – Súmula 377 do STJ: visão monocular e as vagas reservadas a pessoas com deficiência em concurso público

Apensar de somente em 2021 ter sido publicada uma lei equiparando a cegueira monocular ao conceito de “deficiência”, o assunto já era amplamente debatido nos Tribunais, inclusive com entendimento sumulado acerca do tema.

Trata-se da súmula 377 do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que possui o seguinte verbete: “O portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às vagas reservadas aos defiecientes.”.

Portanto, o STJ já possuia entendimento equiparando visão monocular a ocorrência de deficiência apta a permitir a candidato a certame público possa concorrer as vagas reservadas a pessoas com deficiência.

Para o STJ, a existência de visão monocular, por isso, era capaz de colocar o candidato em condições de desigualdade em relação aos demais candidatos.

Importante – modificação legislativa – LEI 14.768/23 – ronhece a surdez unilateral como deficiência para todos os fins e efeitos:

Atualização – abaixo texto antigo

Sobre o tema, é importante destacar que a surdez unilateral, por sua vez, não pode ser enquadrada na concepção de deficiência para fins de que se permita ao candidato concorrer as vagas reservadas a pessoa com deficiência, conforme súmula 552 do STJ

O portador de surdez unilateral não se qualifica como pessoa com deficiência para o fim de disputar as vagas reservadas em concursos públicos. (SÚMULA 552, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2015, DJe 09/11/2015)”

Atualização de texto:

Não tem muito, foi aprovada a Lei 14.768/23, que passou a considerar a surdez unilateral (apenas um ouvido) ou a bilareral (dois ouvidos) como dificiência, incidindo, portanto, todos os efeitos leigais. Vejamos:

Art. 1º Considera-se deficiência auditiva a limitação de longo prazo da audição, unilateral total ou bilateral parcial ou total, a qual, em interação com uma ou mais barreiras, obstrui a participação plena e efetiva da pessoa na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.

§ 1° Para o cumprimento do disposto no caput deste artigo, adotar-se-á, como valor referencial da limitação auditiva, a média aritmética de 41 dB (quarenta e um decibéis) ou mais aferida por audiograma nas frequências de 500 Hz (quinhentos hertz), 1.000 Hz (mil hertz), 2.000 Hz (dois mil hertz) e 3.000 Hz (três mil hertz).

Obs. É bem certo que a súmula 552 do STJ seja cancelada.

6 – Impacto da Lei 14.126/2021 e os seus alcances:

A verdade é que, pelo contexto da existência de deficiência pela ocorrência de visão monocular, a Lei 14.126/2021 veio apenas para consolidar uma situação fática que já vinha sendo reconhecida pelos tribunais.

Um exemplo disso era a já citada súmula 377 do STJ, que permitia ao agente com visão monocular participar de certames nas vagas reservadas a pessoa com deficiência.

Agora, publicada a lei que a equipara a deficiência para todos os seus efeitos e fins legais, espera-se reduzir os empecilhos para que o agente com deficiência tenha acesso a direitos básicos, como, por exemplo, isenção de imposto de renda, concessão de benefício do tipo BPC (Benefício de Prestação Continuada) ou aposentadoria.

A intenção do legislador foi claramente de reduzir as “barreiras” que ainda recaiam sob os portares de visão monocular.

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