1 – Sobre o crime de furto praticado durante o repouso noturno (§ 1º, do art. 155 do CP):
Dando continuidade ao tema “crime de furto simples e furto qualificado”, hoje veremos a hipótese de furto praticado durante repouso noturno.
Neste post veremos um pouco mais sobre o tema já mencionado. Já vimos que o crime de furto consiste em “subtrair” para “si ou para outrem coisa alheia móvel”, conforme art. 155, do Código Penal.
O crime de furto é bastante amplo e ganhou alguns “ups” nos últimos anos.
Não obstante, o furto simples ou qualificado cometido durante o repouso noturno constituirá causa de aumento de pena. Não se trata de furto qualificado, são coisas distintas.
O furto simples (art. 155 do CP) pode ser majorado pelo repouso noturno (§ 1º, do art. 155 do CP), ao mesmo tempo que também é possível a ocorrência de furto qualificado (art. 155, §§ 4º, 4-Aº, 5º, 6º, 7º todos do CP) com a incidência da majorante do repouso noturno (STF. HC 130952/MG, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 13.12.2016. Informativo 851). Portanto, uma coisa não exclui a outra.
2 – Previsão legal do furto simples e qualificado praticado durante repouso noturno – art. 155, § 1º, do CP:
Como já mencionado, o crime de furto possui como causa de aumento de pena o § 1º, do art. 155, do CP, ou seja, furto praticado durante o repouso noturno. Vejamos.
“Art. 155 – Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º – A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.”
3 – Pena do crime de furto praticado durante repouso noturno:
A causa de aumento de pena acima aduz que no furto praticado durante o repouso noturno a pena será aumentada de 1/3 (um terço).
Portanto, sendo causa de aumento de pena, esta incidirá na terceira fase da dosimetria da pena.
Como bem sabemos, o nosso ordenamento jurídico adotou o chamado sistema trifásico da dosimetria da pena (art. 68 do Código Penal).
Desse modo, temos: pena-base (art. 59 do Código Penal), causas atenuantes (art. 65 do Código Penal) e agravantes (art. 61 do Código Penal) e as causas de aumento e diminuição de pena.
As causas de aumento de pena estão previstas expressamente em determinados tipos penais, como é o caso da majorante do furto praticado durante o repouso noturno (§ 1º, do art. 155 do CP).
Exemplo: agente condenado pelo crime de furto praticado durante o repouso noturno.
A pena-base foi fixada em 01 (um) ano, não concorrendo quaisquer causas de diminuição ou agravamento de pena na segunda fase da dosimetria.
Na terceira fase, a pena será aumentada em 1/3 (um terço), ficando a pena final em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses.
3.1 – Mas o que seria o chamado repouso noturno?
Então basta que o crime de furto seja praticado durante a noite para que incida a causa de aumento de pena do § 1º, do art. 155 do CP? Não é bem assim, vamos com calma. A lei fala em “repouso noturno” e não em crime noturno.
Portanto, percebe-se que há uma diferença. A lei exige, além de que seja noite, que o crime seja praticado durante o repouso. Isto é: noite + repouso = repouso noturno.
Então se a vítima estiver acordada durante o assalto não poderá se falar em repouso noturno, é isso? Não funciona assim.
O objetivo do legislador foi de dar mair proteção a certas situações e, nesse caso, optou por introduzir uma causa de aumento de pena para os crimes praticados durante o repouso noturno.
Nesse sentido, é importante entender o que se entende sobre repouso noturno para fins de incidência do § 1º, do art. 155, do CP.
Não basta que seja noite, que fique claro. É necessário que o crime de furto ocorra em momento no qual aquela comunidade ou mesmo cidade normalmente se recolhe, ou seja, costuma, como se diz no interior, “fechar as portas e passar pra dentro”.
Essa situação deverá ser verificada no caso concreto, na medida que o conceito de “repouso noturno” pode variar conforme o local.
Critério bastante subjetivo, ficando a cargo do magistrado verificar se naquelas circunstâncias incide a qualificadora do repouso noturno.
3.2 – Aplica-se a qualificadora do repouso noturno se o imóvel estiver desabitado ou se tratar de comércio?
Imagina que “A”, ciente de que um imóvel situado em seu bairro fica desabitado durante a semana resolve furtar os bens presentes no imóvel e para tanto resolve aguardar o anoitecer para evitar que seja visto durante a prática delitiva.
Conforme exemplo, diante de imóvel desabitado, incide a causa de aumento de pena pelo repouso noturno?
O STJ entende que sim. Pouco importa se o imóvel esta habitado ou mesmo se se trata de imóvel comercial (loja, por exemplo), a causa de aumento incidirá do mesmo modo.
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FURTO. CRIME OCORRIDO DURANTE O REPOUSO NOTURNO. APLICAÇÃO DA MAJORANTE DO ART. 155, § 1º, DO CÓDIGO PENAL ? CP. ESTABELECIMENTO COMERCIAL. IRRELEVÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que, para aplicação da majorante do § 1º do art. 155 do Código Penal, basta que o furto seja praticado durante o repouso noturno, ainda que o local dos fatos seja estabelecimento comercial ou residência desabitada, tendo em vista que a lei não faz referência ao local do crime. […]. (AgRg no REsp 1851700/DF, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 22/09/2020, DJe 28/09/2020)”
Portanto, conforme decisão colacionada acima, pouco importa se o imóvel é uma residência desabitada ou comercial, a causa de aumento de pena do repouso noturno incidirá do mesmo modo. E mais, mesmo se, eventualmente, as vítimas estiverem acordadas ou em via pública ainda assim se aplica a causa de aumento de pena do § 1º, do art. 155 do CP. (STJ. AgRg nos EDcl no REsp 1849490/MS, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 15/09/2020, DJe 22/09/2020).
4 – Caso Fictício – furto majorado pelo repouso noturno:
“A”, brasileiro, solteiro, nascido em 2000, percebeu que no caminho para o trabalho havia uma casa com pouca vigilância.
Ao sair do trabalho, por volta das 22h, “A” resolveu adentrar na casa objetivando furtar eventuais objetos que lá estivessem.
Dito isso, “A” subtraiu um notebook avaliado em R$ 4.000,00 (quatro mil reais). “A” foi preso em flagrante logo após o cometimento do delito.
O flagranteado foi indiciado pelo crime de furto praticado durante o repouso noturno, tendo sido efetivamente denunciado pelo crime do art. 155, § 1º, do Código Penal.
O processo teve seu regular processamento com a devida apresentação de resposta à acusação, audiência de instrução e julgamento com apresentação de memoriais finais orais ao final.
Após, o processo seguiu concluso para sentença e em sede de sentença o juiz condenou o réu ao crime de furto praticado durante o repouso noturno. A pena-base foi fixada em 03 (três) anos, não concorrendo quaisquer causas atenuantes ou agravantes. Na terceira fase, a pena foi aumentada em 1/3 (um terço), sendo a pena final fixada em 04 (quatro) anos.
Veja mais em:
Direitos da personalidade – art. 11 do CC/02
Hipóteses de demissão por justa causa (art. 482 da CLT)
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