1 – STF entende pela possibilidade de promoção de extinção de execuções fiscais de pequeno valor, por ausência de interesse de agir, nos termos da decisão proferida no julgamento do Tema 1184:
De acordo com o Supremo Tribunal Federal – STF, o juiz pode promover a extinção de execuções fiscais de pequeno valor, conforme fora decidido no julgamento do tema 1184.
Para o STF, pode o juiz extinguir execuções fiscais que sejam de pequeno valor, caso entenda que, naquelas circunstâncias, restar verificada a inocorrência do chamado “interesse de agir”.
Hoje falaremos sobre a recente decisão do STF que trata da possibilidade de o Juiz extinguir execuções fiscais que sejam de pequeno valor.
Não tem muito tempo que o STF, no tema 1184 (Repercussão Geral – RE 1355208), veiculado no informativo de nº 1121, entendeu pela possibilidade de, no caso concreto, o Magistrado, caso verifique a ocorrência do chamado interesse de agir, extinguir execuções fiscais que tenham como objeto a execução de débitos tidos como de pequeno valor.
O assunto ora discutido é relevante pelo fato de se tratar de alteração de entendimento anterior e pelo grande impacto em milhares de ações em curso, em especial aquelas que tem municípios pequenos como exequentes (credores).
Esta publicação abordará os seguintes pontos:
Esperamos que faça uma boa leitura.
2 – TEMA 1184 – Extinção de Execuções Fiscais de Pequeno Valor – Pode o juiz extinguir execuções fiscais que sejam de pequeno valor
Não tem muito tempo que o STF, no julgamento do Tema 1184, firmou tese pela possibilidade de o Juiz extinguir execuções fiscais, fixando, para tanto, critérios para que isso ocorra no caso concreto. Vejamos:
Tese (Tese 1184 – RE 1355208):
“1. É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado.
2. O ajuizamento da execução fiscal dependerá da prévia adoção das seguintes providências: a) tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa; e b) protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida.
3. O trâmite de ações de execução fiscal não impede os entes federados de pedirem a suspensão do processo para a adoção das medidas previstas no item 2, devendo, nesse caso, o juiz ser comunicado do prazo para as providências cabíveis”
Em síntese, o Supremo Tribunal Federal passou a entender pela possibilidade de que ações de execução fiscais em curso sejam extintas, caso se enquadrem nas condições acima.
Além disso, também fixou como conduta obrigatória a “[…] a) tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa; e b) protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida.”.
Era muito comum que os Entes Públicos, sem qualquer tentativa de resolução consensual do conflito, já promovessem a execução judicial do débito.
Considerando, ainda, as prerrogativas da Lei de Execução Fiscal, poderia ser que, no caso concreto, uma execução se tornasse excessivamente onerosa, sobretudo em se tratando de pequenas quantias.
Dito isso, considerando a tese fixada no Tema 1184, agora, para fins de proposição de uma execução fiscal, necessário se faz que o ente público adote medidas extrajudiciais para tentativa de resolução consensual do conflito.
Portanto, além da admissibilidade de extinção/encerramento de execuções de pequeno valor, também deve o ente público exequente, adotar medidas para resolução de forma extrajudicial.
Naturalmente, cada ente público deve adotar as medidas necessárias para regular as formas e métodos de resolução consensual dos conflitos.
Também é necessário pontuar que execuções fiscais de pequeno valor, via de regra, são excessivamente onerosas, tendo em vista que os entes públicos possuem isenção de custas e emolumentos e, normalmente, os executados são beneficiários da justiça gratuita.
2.1 – O que seria a ausência de interesse de agir nas ações de execução fiscal? Ausência de interesse de agir em execuções fiscais de pequeno valor:
O que seria a ausência de interesse de agir nas ações de execução fiscal?
Para que uma ação judicial prossiga e tenha seu mérito julgado, deve o autor demonstrar legítimo interesse no seu prosseguimento/ajuizamento.
Sobre o interesse processual, podemos inferir que não se ajuíza uma ação judicial para obter aquilo que já se tem ou mesmo quando não há negativa no reconhecimento/fornecimento da pretensão.
Em síntese, não se cobra/pleiteia/requer aquilo que nunca lhe foi negado.
No caso das execuções fiscais, era bastante comum a ausência de qualquer medida anterior visando a cobrança do débito, como o protesto ou inscrição no cadastro de inadimplentes.
É possível que em dado momento ao juízos especializados (ou não) se viram abarrotados de inúmeros processos de pequeno valor e servindo apenas como mero “notificador” de necessidade de pagamento.
2.2 – Critérios para a proposição de execuções fiscais, conforme STF
Além da possibilidade extinção de execuções de quantias de pequeno valor, o STF definiu que para fins de proposição de execuções fiscais, deve o ente público lançar mão das seguintes ferramentas (sem prejuízo de outras, claro):
a) “tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa”: cabe ao ente público, dentro de sua esfera de competência, regular e criar os meios de resolução consensual do conflito.
Antes de ajuizar a ação de execução, o entre público deve tentar, de forma consensual, o pagamento do débito. Pode, por exemplo, que o município crie mecanismos de parcelamento do débito.
b) “protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida.”: o protesto do débito também é um dos métodos hábeis para compelir ao pagamento. O ente exequente deve fazer uso de tal mecanismo ou demonstrar, efetivamente, sua impossibilidade.
2.2.1 – Critérios do CNJ para a proposição de execuções fiscais:
Para regulamentar a decisão fixada no tema 1184, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, aprovou a Resolução Nº 547 de 22/02/2024, que regulamenta os requisitos para ajuizamento de ações de execução. Vejamos:
“Art. 2º O ajuizamento de execução fiscal dependerá de prévia tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa.
§ 1º A tentativa de conciliação pode ser satisfeita, exemplificativamente, pela existência de lei geral de parcelamento ou oferecimento de algum tipo de vantagem na via administrativa, como redução ou extinção de juros ou multas, ou oportunidade concreta de transação na qual o executado, em tese, se enquadre.
§ 2º A notificação do executado para pagamento antes do ajuizamento da execução fiscal configura adoção de solução administrativa.
§ 3º Presume-se cumprido o disposto nos §§ 1º e 2º quando a providência estiver prevista em ato normativo do ente exequente.
Art. 3º O ajuizamento da execução fiscal dependerá, ainda, de prévio protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida.
Parágrafo único. Pode ser dispensada a exigência do protesto nas seguintes hipóteses, sem prejuízo de outras, conforme análise do juiz no caso concreto:
I – comunicação da inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres (Lei nº 10.522/2002, art. 20-B, § 3º, I);
II – existência da averbação, inclusive por meio eletrônico, da certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora (Lei nº 10.522/2002, art. 20-B, § 3º, II); ou
III – indicação, no ato de ajuizamento da execução fiscal, de bens ou direitos penhoráveis de titularidade do executado.”
Lembrado que as medidas destacadas acima são cumulativas.
A ideia é limitar a intervenção do poder judiciário em situações que, possivelmente, poderiam ser resolvidas através de outros meios, inclusive menos onerosos.
2.3 – Relevância do tema e impacto nos Municípios de menor porte e mudança de entendimento anterior
O tema ora abordado, isto é, sobre a admissibilidade de extinção de execuções fiscais tidas como de pequeno valor, merece destaque por diversos motivos mas, principalmente, por dois em especial: impacto nos municípios e divergência entre Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça – STJ sobre o assunto.
2.3.1 – Impacto nos municípios:
Certamente, a decisão tomada sobre o Tema 1184, afetará sobretudo municípios de menor porte, em especial, execuções de IPTU (imposto predial territorial urbano).
É bastante comum inadimplência de IPTU em municípios pequenos, em especial porque, dado o valor pequeno do débito (normalmente) o Município opta por não cobrar e apenas executar os últimos cinco anos.
Por não ter cobranças ativas, o devedor também não dá prioridade ao pagamento.
Tal situação, acarreta em inúmeras execuções de valores que podem ser considerados ínfimos (inferiores a R$ 500,00, por exemplo).
Na prática, o Magistrado se via com centenas de execuções de valores que, na prática, não valem o esforço de todo o aparato judicial, sejam pelo tempo que usualmente essas ações tomam ou mesmo pelo esforço e gasto para movimentar toda a máquina judiciária.
Ocorre que, agora, após a fixação da tese do Tema 1184, os municípios devem, antes de propor a execução (necessariamente), tentar a resolução consensual da medida como, por exemplo, conciliação e protesto do título. Trata-se de condição necessária para demonstrar o interesse de agir.
Além disso, agora passa a ser legítima e cabível a extinção de execução de pequeno valor pelo magistrado (conforme fixado no Tema 1184).
Certamente, tal possibilidade traz grande impacto para os Municípios de pequeno porte, com a extinção em massa de inúmeras execuções fiscais.
2.3.2 – Divergência entre Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça (Súmula 452 do STJ)
O outro ponto que torna essa decisão relevante diz respeito a divergência do entendimento do STF sobre o assunto e do STJ, que inclusive possui súmula sobre o tema.
Em síntese, o STF disse ser possível a extinção de execuções fiscais entendidas como de baixo valor pelo Magistrado. Entretanto, o STJ possuía entendimento consolidado pela impossibilidade de extinção, conforme entendimento transcrito abaixo:
“A extinção das ações de pequeno valor é faculdade da Administração Federal, vedada a atuação judicial de ofício.” (REsp 1125627/PE)”
O STJ também fixou súmula sobre o tema. Trata-se da súmula 452 do STJ. Vejamos:
Súmula 452 do STJ: “A extinção das ações de pequeno valor é faculdade da Administração Federal, vedada a atuação judicial de ofício.”
Portanto, para o STJ, a prerrogativa de desistir ou de não ajuizar ações de pequeno valor seria prerrogativa exclusiva da Administração Pública.
Isto é, mesmo que se trate de execução de pequeno valor, não poderia o juiz extingui-la por ausência de interesse de agir. Esse era entendimento que prevalecia.
O fundamento seria que não caberia ao Magistrado definir a relevância ou não do valor executado, pois cada Ente Público teria a devida autonomia para definir sobre o que seria relevante ou não para fins de execução fiscal.
É bastante comum que os Municípios aprovem leis regulamentando o valor mínimo para fins de execução judicial. Isto é, no fim, cabia ao Município definir o que seria ou não relevante para fins de execução fiscal.
Com o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, o Magistrado, quando considerar a execução de valor pequeno, pode entender que não há interesse de agir naquele procedimento executivo e extingui-lo.
E extinção do processo quando evidenciada a ausência de interesse de agir é a extinção deste sem a resolução do mérito, com fundamento no inciso VI, do art. 485 do CPC/15.
2.4 – Definição de pequeno valor para fins de extinção de execuções fiscais
Agora que já vimos que é possível a extinção de execuções fiscais reputadas como de baixo valor, surge a seguinte discussão “o que é pequeno valor”?
Pois bem, qual critério pode o Magistrado utilizar para definir o que seria uma execução de pequeno valor?
O Conselho Nacional de Justiça – CNJ, aprovou a Resolução Nº 547 de 22/02/2024, que possui a seguinte previsão:
“Art. 1º É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir, tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado.
§ 1º Deverão ser extintas as execuções fiscais de valor inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais) quando do ajuizamento, em que não haja movimentação útil há mais de um ano sem citação do executado ou, ainda que citado, não tenham sido localizados bens penhoráveis.”
O CNJ trouxe uma hipótese em que a execução deve ser extinta.
Os Tribunais de Justiça também podem expedir recomendações sobre a extinção das execuções, bem como o que pode ser considerado de “pequeno valor”.
Assim, certamente, cada Tribunal deverá no futuro (caso ainda não tenham feito), disciplinar a matéria levando em consideração a realidade de cada Estado ou região.
Nada obstante, que o Juiz também utiliza como critério eventual lei municipal que discipline o tema.
3 – Exemplos:
Imagine que um determinado município “A”, ajuizou ação de execução em face de “B”, requerendo a execução de débito de IPTU no valor de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), já corrigidos e atualizados.
“B”, após citado, ofereceu embargos à execução fiscal alegando ausência de interesse de agir e ausência de tentativa de solução consensual do conflito.
O magistrado acatou o pleito, fundamento sua decisão no atual entendimento do STF.
4 – Conclusão:
Considerando tudo o que foi exposto acima, concluímos pela admissibilidade/permissibilidade não prosseguimento de execuções na natureza fiscal entendidas como de pequeno valor.
Na hipótese de execução de pequeno valor, pode o Magistrado, com fundamento no inciso VI, do art. 485 do CPC/15, extingui-la, por entender que não existe interesse de agir em demanda execução de baixo valor.
Cada Tribunal pode definir o que é considerado “pequeno” valor para fins de se aferir a existência de interesse de agir em demandas executórias.
Por fim, também ficou demonstrado que o exequente, antes de propor a execução, deve adotar as medidas contidas nos artigos 2º e 3º, da Resolução de nº 547 de 22/02/2024, do CNJ.
Além disso, também podemos inferir pela superação do entendimento do STJ sobre a impossibilidade extinção de execuções de pequeno valor pelo magistrado, podendo o Juiz, com base no entendimento atual do STF, extinguir execuções fiscais de pequeno valor.
FONTES:
Veja mais em:
Modelo de ação de investigação de paternidade – Lei 8.562/92
Petição de extinção do processo pela morte do autor – CPC/15