I – Critérios para definição da competência:
De início destacamos que abordaremos os conceitos de conexão e continência do Código de Processo Civil – CPC/15.
A conexão e continência poderão, no caso concreto, modificar a competência para o julgamento determinado feito, conforme regras preexistentes no CPC/15.
Como é cediço, o princípio do devido processo legal aduz que o processo deve seguir regras predeterminadas sob pena de, no caso concreto, acarretar em nulidade do feito.
Desta feita, o CPC possui um título inteiro para tratar sobre a competência interna e, dentro deste, um capítulo voltado para a definição da competência.
O Capítulo I, do Título III, do CPC traz uma série de normas e regras que devem ser observados para definir qual será o juízo competente para apreciar, processar e julgar determinada demanda.
Saliente-se, que não se trata de escolher um juiz em específico, mas de saber que em uma demanda do tipo “Y” será um juiz de competência “Y” que julgará, inclusive considerando o território que o feito deverá ser processado e julgado.
Tais regras podem ser encontradas, principalmente, no Capítulo I, do Título III, do CPC, ressalvando-se, claro, disposições em sentido contrário (que são bem comuns por sinal).
Saber a competência para julgar determinada demanda se mostra essencial para que se preserve o princípio constitucional do juiz natural consagrado no inciso XXXVII, do art. 5º da CF/88.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção;
[…]
LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;”
Além disso, protocolar a ação no foro correto evitará o alongamento desnecessário da relação processual e embaraços.
Não obstante, o art. 44 do CPC aduz que, ressalvadas as hipóteses constitucionais, legislação especial, normas de organização judiciária e/ou mesmo a Constituição Estadual (no que for pertinente), as regras e normas sobre competência serão definidas pelo Código de Processo Civil.
Dito isso, o Capítulo I, do Título III, do CPC traz um rol de regras que devem ser observados (além de outras normas e regras de competência eventualmente definidas na norma processual).
O art. 53 do CPC determina as regras gerais para definição da competência. Vejamos:
“Art. 53. É competente o foro:
I – para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável:
a) de domicílio do guardião de filho incapaz;
b) do último domicílio do casal, caso não haja filho incapaz;
c) de domicílio do réu, se nenhuma das partes residir no antigo domicílio do casal;
d) de domicílio da vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha); (Incluída pela Lei nº 13.894, de 2019)
II – de domicílio ou residência do alimentando, para a ação em que se pedem alimentos;
III – do lugar:
a) onde está a sede, para a ação em que for ré pessoa jurídica;
b) onde se acha agência ou sucursal, quanto às obrigações que a pessoa jurídica contraiu;
c) onde exerce suas atividades, para a ação em que for ré sociedade ou associação sem personalidade jurídica;
d) onde a obrigação deve ser satisfeita, para a ação em que se lhe exigir o cumprimento;
e) de residência do idoso, para a causa que verse sobre direito previsto no respectivo estatuto;
f) da sede da serventia notarial ou de registro, para a ação de reparação de dano por ato praticado em razão do ofício;
IV – do lugar do ato ou fato para a ação:
a) de reparação de dano;
b) em que for réu administrador ou gestor de negócios alheios;
V – de domicílio do autor ou do local do fato, para a ação de reparação de dano sofrido em razão de delito ou acidente de veículos, inclusive aeronaves.”
Se ainda persistirem dúvidas sobre qual o foro competente para determinada ação, consulte o Capítulo I, do Título III, do CPC.
II – Sobre a possibilidade de ocorrência de modificação da competência em razão da conexão ou da continência – art. 54 do CPC/15:
Feita a introdução acima, debateremos a possibilidade de modificação da competência pelos institutos da conexão e continência.
A seção II, do Capítulo I, do Título III, do CPC/15, versa sobre a possibilidade de alteração da competência pela chamada conexão e continência, conforme art. 54 do CPC/15.
“Art. 54. A competência relativa poderá modificar-se pela conexão ou pela continência, observado o disposto nesta Seção.”
Portanto, de modo expresso o CPC entende pela modificação quando se tratar de conexão e/ou continência. Mas a dúvida que fica é: “O que é conexão?” e “O que é continência?” “Quando será possível a modificação da competência?”. Vejamos logo abaixo.
III – O que é conexão? – art. 55 do CPC/15:
Pode ocorrer de, no caso concreto, duas (ou mais ações) possuírem, em comum, a causa de pedir ou o pedido – conforme art. 55 do CPC/15. Nessa hipótese, estaremos diante do que se chama de conexão, de acordo com o já mencionado artigo.
“Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.
§ 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado.”
Portanto, para ocorrer a conexão, deve ficar evidenciado nos autos a ocorrência de pedido ou de causa de pedir semelhantes.
Pedido = basicamente, é o que se pede na ação. Exemplo: pedido de condenação em danos morais. Trata-se de requisito essencial da petição inicial (art. 319, inciso IV, do CPC).
Causa de pedir = de modo bastante resumido (pois assunto é muito mais amplo), a causa de pedir consiste no fato que embasa a proposição da ação. Exemplo: acidente de trânsito.
Assim sendo, caso duas ou mesmo mais ações tenham o pedido e/ou a causa de pedir em comum (iguais ou muito semelhantes), os processos poderão ser reunidos para fins de julgamento conjunto (art. 55, § 1º, do CPC).
Não será possível a reunião se um dos processos já tiver sido sentenciado, conforme já citadao artigo e súmula 235 do Superior Tribunal de Justiça – STJ.
Exemplo: prédio público que cai e vem a lesionar várias pessoas. São ajuizadas ações por damos morais; ações por danos materiais e ações por danos estéticos. Isto é, várias ações fundadas em um mesmo fato, qual seja, o desabamento de um prédio público.
III. I – A conexão poderá ser reconhecida nos seguintes casos (art. 55, § 2º, do CPC/15):
I – “à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico;”
II – “às execuções fundadas no mesmo título executivo.”
III. II – Conexão na hipótese do art. 55, § 3º, do CPC/15:
O Código de Processo Civil reconheceu expressamente a possibilidade de conexão, independentemente se há relação de conexão entre a chamada causa de pedir e/ou pedido.
Pois, para o CPC, o importante é manter a coerência dos julgados.
Portanto, havendo possibilidade de “risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente”, poderá ocorrer a reunião dos processos nos moldes do § 3º, do art. 55, do CPC/15.
Esse tipo de reunião visa, como já mencionado, a coerência dos julgados para evitar a ocorrência de decisões conflitantes e/ou contraditórias.
III. III – Ainda sobre a conexão:
➜ Obs: não será possível a modificação de competência se está for de natureza absoluta, conforme jurisprudência do STJ (MS 22.703/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/08/2017, DJe 30/11/2017).
Assim, quando se fala em modificação da competência (art. 54, do CPC), esta diz respeito a competência relativa – (STJ. AgInt no MS 25.945/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2020, DJe 24/11/2020).
➜ Obs 2: o reconhecimento da conexão e a consequente reunião dos processos constitui mera faculdade do Magistrado, conforme jurisprudência do STJ. (AgRg no REsp 1483832/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/10/2015, DJe 13/10/2015).
No caso concreto, o Magistrado levará em consideração a pertinência e a viabilidade da reunião.
Pode ser que um dos processos esteja “mais avançado” do que os demais. Nesse caso, não seria viável ou mesmo razoável a reunião.
IV – Sobre a continência – art. 56 do CPC:
A continência também tem o condão de modificar a competência, quando relativa (art. 54 do CPC). A continência possui amparo legal no art. 56 do CPC. Vejamos:
“Art. 56. Dá-se a continência entre 2 (duas) ou mais ações quando houver identidade quanto às partes e à causa de pedir, mas o pedido de uma, por ser mais amplo, abrange o das demais.”
IV. I – Mas o que é continência?
Quem nos responde a tal questionamento é o art. 56 do CPC, que entende que restará configurada a continência quando duas ou mais ações, possuírem partes e causa de pedir iguais, porém, o pedido de uma será mais amplo e abrangerá os demais.
“Art. 56. Dá-se a continência entre 2 (duas) ou mais ações quando houver identidade quanto às partes e à causa de pedir, mas o pedido de uma, por ser mais amplo, abrange o das demais.”
Exemplo: Prédio Público pertencente ao ente “A” vem a desabar e lesiona diversas pessoas.
Dentre tais pessoas está “P”. “P” ajuíza ação de danos morais em face do ente “A”. Ocorre, que meses depois, “P” ajuíza nova ação pedido danos morais, danos materiais e danos estéticos.
Conforme exemplo, há duas ações em curso com partes iguais e fundadas na mesma causa de pedir (queda do prédio), porém, a segunda ação é mais ampla, possuindo pedidos mais abrangestes e diversos dos pedidos formulados na primeira ação.
VI. II – Efeitos do reconhecimento da continência – art. 57 do CPC:
Sendo reconhecida a continência, poderá acontecer duas coisas conforme o caso. Vejamos:
Extinção da ação sem resolução de mérito (art. 485 do CPC): caso a ação continente (ação mais ampla) tenha sido proposta antes da ação contida (menos abrangente), ocorrerá a extinção da ação menos abrangente (contida). A extinção não adentrará no mérito da ação – art. 57 do CPC/15 e art. 485 do CPC.
Reunião dos processos: ocorrerá a necessária reunião dos processos quando a ação contida (menos abrangente) tiver sido ajuizada antes da ação continente (mais abrangente) – art. 57 do CPC/15.
V – Ainda sobre a conexão e continência:
Assim como na conexão, a reunião dos processos quando for hipótese de continência também se trata de faculdade do juiz, devendo que o Magistrado analise a possibilidade de reunião com base na conveniência processual (STJ. AgInt no AREsp 1314005/PE, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 06/05/2020).
Em se tratando de hipótese de reunião dos processos, esta ocorrerá no juízo prevento – art. 58 do CPC. O juiz se torna prevendo com o registro ou distribuição da petição inicial – art. 59 do CPC.
O réu deverá arguir a ocorrência de conexão ou continência em sede de contestação, ou melhor, nas preliminares de contestação – art. 337 do CPC.
Esse foi um breve resumo sobre conexão de continência. Buscamos abordar os fundamentos legais e alguns posicionamentos jurisprudenciais sobre a conexão e continência.
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