1 – Sobre a ação de guarda ou ação de regulamentação de guarda:
Em outra oportunidade já discutimos o instituto da guarda (recomendamos a leitura) presente no Código Civil e neste post apresentaremos um modelo de ação de guarda unilateral (ou caso prefira ação de regulamentação de guarda).
De imediato, destacamos que o modelo ora apresentado diz respeito a imprescindibilidade de regulamentação da guarda entre os progenitores eventualmente em litígio (ou não, pode apenas ser para fins de definição da situação).
ATENÇÃO: caso procure um modelo de guarda para fins de colocação em família substituta, com fulcro nos arts. 28 e 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, veja AQUI, afinal são coisas distintas.
2 – Fundamento legal – art. 1.583 do CC e seguintes:
O fundamento legal para o pleito de concessão de guarda unilateral é extraído do art. 1.583 e seguintes do Código Civil. Vejamos:
“Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 o ) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).”
Ante um litígio de pais quanto a guarda da prole, será cabível uma ação de guarda (ou ação de regulamentação de guarda) para fins de obtenção da tutela desejada.
Também é permitida a formulação do pleito de guarda em ação de divórcio, por exemplo. Porém, aqui lançaremos mão de um modelo de ação de guarda unilateral, sendo, portanto, ação autônoma.
3 – Juízo e foro competente para apreciar o pleito de guarda:
O Juízo competente deverá ser aquele que detiver atribuições para processar e julgar as causas relativas a interesse de menor, isto é, o “Juízo da Infância e da Juventude”, conforme se depreende do art. 146 do ECA.
Conforme Lei de Organização Judiciária (muita atenção a esta), pode ser que a sua comarca possua uma (ou mais) varas da Infância e da Juventude ou que possua uma vara com atribuição para julgar esse tipo de feito.
Também não é raro que em comarcas menores exista uma vara única que julgará todos os tipos de ações e, por consequência, as ações de guarda. Portanto, o juízo competente será o da Infância e da Juventude ou o que possuir tal atribuição (art. 146 do ECA).
Mas qual será o foro competente? Aqui muitos podem imaginar que se deve seguir a determinação do art. 50, Código de Processo Civil de 2015 – CPC/15. Mas o fato é que, na situação concreta, se aplique o entendimento da súmula 383 do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que guarda o seguinte enunciado:
Súmula 383 – STJ: “A competência para processar e julgar as ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do domicílio do detentor de sua guarda.”
Conforme verbete transcrito acima, as ações como modificação de guarda, por exemplo, serão ajuizadas no foro de domicílio do possuidor da guarda.
Parece algo claro, mas e se não existir guarda de direito definida ou mesmo se existirem duas decisões de juízos de comarcas diversas concedendo guarda provisória.
Nessas situações, quem será o juízo competente? Aquele em que primeiro a petição foi protocolada (art. 59 do CPC/15)? Não. Para situações assim, o STJ decidiu que o foro competente, deverá ser aquele que detiver a guarda de fato, ou seja, a guarda efetiva do menor. Vejamos:
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO INTERNO NO CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÕES DE GUARDA. CUSTÓDIA DEFERIDA A AMBOS OS GENITORES EM AÇÕES DISTINTAS. SÚMULA 383/STJ. PREVALÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DO JUÍZO IMEDIATO E DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. Nos termos da Súmula 383/STJ: “A competência para processar e julgar as ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do domicílio do detentor de sua guarda.” 2. Na hipótese, os pais disputam a guarda do filho menor impúbere em duas ações contrapostas, nas quais ambos obtiveram a guarda judicial provisória, caracterizando-se o conflito positivo de competência entre os juízos paulista e potiguar.
3. Conflito resolvido levando-se em consideração as circunstâncias do caso, o enunciado da Súmula 383/STJ, bem como o princípio do juízo imediato, previsto no art. 147, I e II, do ECA, atrelado ao princípio do melhor interesse da criança, declarando que a competência para processar e julgar as ações conexas de interesse do menor deve ser fixada no foro do domicílio do detentor presente da guarda, ou seja, o da mãe, detentora atual da guarda efetiva, já que ambos os genitores possuem a guarda judicial provisória da criança.
4. Embargos de declaração julgados como agravo interno desprovido.
(EDcl no CC 171.371/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/08/2020, DJe 18/08/2020).”
O STJ, após uma análise conjunta da súmula 383, do STJ, princípio do melhor interesse da criança e art. 147, inciso II, do ECA, o foro para processamento do feito deverá ser aquele de que detiver a guarda de fato, isto é, efetiva do menor.
“ Art. 147. A competência será determinada:
I – pelo domicílio dos pais ou responsável;
II – pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente, à falta dos pais ou responsável.”
Em síntese: o juízo será aquele do foro de domicílio dos país ou responsável e na falta desta do lugar em que está a criança/adolescente, observando, ainda, quem possui a quem de fato. A competência nesses casos é absoluta e não comporta prorrogação.
Sanada tal controvérsia, devemos prosseguir.
5 – Nas ações envolvendo guarda o processo deve tramitar em segredo de justiça – inciso II, do art. 189 do CPC/15 e atuação do Ministério Público (art. 178, inciso II, do CPC):
Não é nenhuma novidade que os processos devem ser públicos, sobretudo para atender a preceitos constitucionais como o da transparência (inciso IX, do art. 93 da Constituição Federal de 1988 – CF/88).
Porém, a própria Constituição e a CPC/15 excepcionam tal regra em situações específicas, conforme ocorre com o inciso II, do art. 189 do CPC/15, isto é, os casos envolvendo guarda, alimentos, divórcio e outros. Vejamos:
“Art. 189. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os processos:
I – […]
II – que versem sobre casamento, separação de corpos, divórcio, separação, união estável, filiação, alimentos e guarda de crianças e adolescentes;”
Não obstante, nos feitos envolvendo interesse de indivíduo incapaz o Ministério Público tem que participar do feito, sob pena de nulidade – inciso II, do art. 178 do CPC/15.
6 – Caso fictício – meramente exemplificativo:
“H”, brasileiro, solteiro, professor, residente na Rua…, nº …, bairro …, Cidade ….., com telefone de nº … e e-mail ….., namorou com “M” brasileira, casada, empresária, residente na Rua…, nº …, bairro …, Cidade ….., com telefone de nº … e e-mail ….., durante os anos de 2014 e 2015 e desta relação surgiu o menor de nome “C”, nascido em 2015.
“H” e “M” terminaram o relacionamento ainda no ano de 2015. Nunca existiu definição quanto a guarda do menor, ficando este com a genitora e nos finais de semana com o genitor.
O senhor “H” recebeu proposta de emprego para ir trabalhar em cidade diversa e passou a afirmar que iria pleitear judicialmente a guarda do menor.
“M” procurou um advogado para tratar da situação. Na ocasião, informou que nunca houve definição quanto a guarda e que o menor, normalmente e na maior parte do tempo, fica com ela, a mãe.
O advogado informou que para aquela situação o mais adequado seria definir a guarda do menor através de uma ação de guarda unilateral, fundada no art. 1.583 do CC/02.
7 – Modelo de ação de guarda unilateral (ação de regulamentação de guarda):
Feitos os esclarecimentos acima e apresentado um caso meramente fictício sobre o problema, agora desenvolveremos um modelo de ação de guarda (ou de regulamentação de guarda), cujo o fundamento se extrai do art. 1.583 do CC/02.
O modelo é uma mera orientação, sempre busque desenvolver sua petição em estrita observância ao seu caso concreto.
EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (ÍZA) DE DIREITO DA _____ª VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE _______/UF (ATENÇÃO A LEI DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA)
AÇÃO DE GUARDA UNILATERAL
“M”, brasileira, casada, empresária, portadora do RG de nº … e CPF de nº …., residente na Rua…, nº …, bairro …, Cidade ….., com telefone de nº … e e-mail ….., vem, com o devido respeito e superior acatamento, a presença de Vossa Excelência, pelo Advogado(a) que esta subscreve, propor a AÇÃO DE GUARDA, com fundamento no art. 1.583 e seguintes do Código Civil de 2002, em face de “H”, brasileiro, solteiro, professor, portador do RG de nº … e CPF de nº …., residente na Rua…, nº …, bairro …, Cidade ….., com telefone de nº … e e-mail ….., com base nos elementos e fundamentos ora delineados.
I – INICIALMENTE
I. I – DA JUSTIÇA GRATUITA
Inicialmente, o(a) autor(a) roga pela concessão da gratuidade da justiça, pois pode ser considerado(a) como presumivelmente hipossuficiente por ser considerados pobre na forma da legislação vigente e assim o sendo, fazem jus, nos moldes do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal de 1988, bem como com alicerce no art. 98 do CPC/15, a gratuidade judiciária, tudo conforme declaração de hipossuficiência anexa.
Assim, roga-se inicialmente pelos benefícios da gratuidade judiciária, pois, como já referido, enquadra-se na situação legal para sua concessão, com base no art. 98 e seguintes do CPC/15.
I. II – DO SEGREDO DE JUSTIÇA (art. 189, inciso II, do CPC/15)
Como o presente feito versa sobre litígio envolvendo guarda, o art. 189, inciso II, do CPC/15 manda que a tramitação ocorra em segredo de justiça para fins de resguardo da intimidade e a vida privada do(a) menor.
II – DOS FATOS
Para fins de melhor análise do presente modelo, levar em consideração o caso fictício do exemplo do tópico 5. No seu caso, faça uma narração coesa e direta da sua situação.
III – DA CONCESSÃO DA GUARDA UNILATERAL, COM BASE NO ART. 1.583, DO CC/02 – PREVALÊNCIA DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA
A Sra. “M”, ora autora e mãe do infante, possui a guarda de fato do menor “C” desde o seu nascimento. Apesar disso, o requerido, que apenas tem contado nos finais de semana, manifestou, por diversas vezes, sua intenção de tomar para si a guarda do menor, pois mudará de cidade.
Muito embora o dever (pode ser depreendido também como direito) cabe a ambos os progenitores, a presente situação indica pela imprescindibilidade de conservação da criança com a progenitora, com a manutenção, claro, do direito de visitas do pai.
O art. 1.583, do Código Civil de 2002 – CC/02, permite que se conceda chamada guarda unilateral e da guarda compartilhada, sendo esta última a regra. Porém, a regra pode ser excepcionada quando as circunstâncias da situação indicarem que a guarda em sua modalidade unilateral é a que melhor atende ao princípio do melhor interesse da criança e adolescente.
Concebe-se, portanto, que a manutenção da guarda de fato e de direito do menor para a genitora é o que melhor atende aos interesses do menor, na medida que o vínculo com a autora e a família materna é mais efetivo do que com o pai, ora requerido.
Infelizmente é impossível a concessão da guarda compartilhada, pois a distância é um impeditivo para sua efetivação. Além disso, sua concessão acarretaria na inviabilidade de distribuição do tempo de convivência entre os genitores. Vejamos:
“Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 1 º […]
§ 2 º Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos. (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)”
A autora tentou realizar acordo extrajudicial quanto a guarda, porém sem êxito, razão essa que motivou a proposição da presente medida judicial. Assim, por conta do litígio, não existe outra solução que não recorrer ao judiciário para fins de obtenção de guarda unilateral, como determina o inciso II, do art. 1.584 do CC/02.
“Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).
I – […]
II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).”
Assim, considerando as conjecturas do presente caso, bem como levando em atenção o princípio do melhor interesse da criança, requer a obtenção de guarda unilateral do(a) menor XXXXXXXX em favor da Sra. XXXXXXX, com fulcro nos arts. 1.583 e inciso II, do art. 1.584, ambos do CC/02.
IV – DA CONCESSÃO DE GUARDA PROVISÓRIA – ART. 300 DO CPC
A concessão da guarda provisória do menor é uma medida necessária. Como é cediço, é plenamente possível a concessão de guarda, mesmo que provisoriamente, conforme estampado no art. 1.585 do CC/02. Vejamos:
“Art. 1.585. Em sede de medida cautelar de separação de corpos, em sede de medida cautelar de guarda ou em outra sede de fixação liminar de guarda, a decisão sobre guarda de filhos, mesmo que provisória, será proferida preferencialmente após a oitiva de ambas as partes perante o juiz, salvo se a proteção aos interesses dos filhos exigir a concessão de liminar sem a oitiva da outra parte, aplicando-se as disposições do art. 1.584. (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)”
Não obstante, os requisitos do art. 300, do Código de Processo Civil de 2015 – CPC/15, estão plenamente presentes. Vejamos:
“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”
AQUI NARRAR E INDICAR OS ELEMENTOS DO ART. 300 DO CPC
Portanto, considerando a presença dos elementos do art. 300, do CPC/15, requer que se conceda a tutela antecipada para fins de que o menor seja mantido sob a guarda da autora, através de guarda provisória.
III – DOS PEDIDOS
Por tudo o que foi exposto, roga-se:
a) – Pela concessão da gratuidade da justiça, nos moldes do art. 98 e seguintes do CPC/15;
b) – Requer que se decrete o segredo de justiça ao feito, em estrita observância ao art. 189, inciso II, do CPC/15;
c) – Que o Ministério Público seja intimado para acompanhar o feito (art. 178, inciso II, do CPC/15);
d) – que seja designada audiência de conciliação nos termos do art. 334, do CPC/15, seja presencialmente ou por meio eletrônico (§ 7º, do art. 334, do CPC/15), em estrita observância ao CPC/15;
e) – que seja determinada a citação do requerido, para, querendo, responder a presente ação, nos termos do art. 335, do CPC/15, bem como acompanhá-la em todos os seus procedimentos, sob pena de decretação da revelia;
f) – Roga-se pela concessão de guarda unilateral do menor XXXXXX em favor da senhora XXXXXXX, ora autora, com alicerce no art. 1.583, do CC/02, pois é a decisão que melhor atende aos interesses do(a) menor.
g) – Requer, desde logo, que se conceda a guarda provisória, com base no art. 1.585, do CC/02, pois os elementos e exigências do art. 300, do CPC/15, isto é, da tutela provisória de urgência, estão presentes.
Protesta provar o alegado por todos os meios de provas admitidos em direito, notadamente, depoimento pessoal do requerido, sob pena de confesso, oitiva de testemunhas, juntada ulterior de documentos, bem como quaisquer outras providências que V. Exa. julgue necessária à perfeita resolução do feito, ficando tudo de logo requerido.
Dá-se à presente causa, apenas para efeitos fiscais, o valor de R$ XX.XXX,XX (XXXXXXXXXXX).
Nestes termos, pede e espera deferimento.
Local/UF, data.
Advogado
OAB/UF de nº…
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