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São excludentes de ilicitude – (art. 23 do Código Penal)

excludentes de ilicitude

1 – O que é excludente de ilicitude?

Quando se fala em excludentes de ilicitude de imediato lembramos do art. 23, do Código Penal (art. 23 CP).

O mencionado artigo elenca as seguintes situações como excludentes de ilicitude. Vejamos:

Art. 23 – Não há crime quando o agente pratica o fato: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I – em estado de necessidade; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

II – em legítima defesa; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.”

 

1.1 – Portanto, são excludentes de ilicitude (art. 23 CP):

2 – Mas afinal, o que é uma excludente de ilicitude?

A lei não traz um conceito para definir o que uma excludente de ilicitude (art. 23 CP).

O art. 23, do CP, apenas fala “não há crime quando o agente pratica o fato”, sem mais esclarecimentos. Nesse momento, você pode imaginar “ah…, mas a lei fala que exclui o crime”.

Certo, mas como já vimos em nosso post sobre princípio da insignificância a doutrina moderna adota a teoria analítica para determinar o que é crime. Rogério Greco (2013, p. 144), por exemplo, concorda com a mencionada teoria, ao entender que crime é: “fato típico, ilícito e culpável”.

2.1 – Mas o que isso tem a ver com as excludentes de ilicitude (art. 23 CP)?

Simplesmente tudo. Quando for hipótese de incidência das excludentes do art. 23, do CP, quaisquer delas, o conceito de crime será, no caso concreto, “quebrado”.

Assim, sendo hipótese do art. 23, do Código Penal, podemos dizer que não ocorreu crime, uma vez que houve a “quebra” do conceito de crime, isso porque, o elemento da “ilicitude” foi excluído.

Ao contrário do princípio da insignificância, que atinge o fato típico, mais especificamente, a tipicidade material, as excludentes atingirão a ilicitude (elemento que compõe o conceito de crime).

Assim, muito embora a ação do agente seja típica (formal e material), se incidir quaisquer das excludentes de ilicitude, o fato será considerado um indiferente penal, em razão da exclusão do elemento da “ilicitude”.

Apenas para fins de esclarecimento, de forma ampla, será considerada ilícita a conduta que contrarie a norma jurídica (GRECO, 2013, p. 309). No caso de ilicitude penal, a conduta do agente deve ser contrária a norma penal (GRECO, 2013, p. 309).

Portanto, com base no princípio da legalidade, não se pode falar em conduta penalmente ilícita se o ato do agente não contraria a lei penal.

 

3 – Hipóteses de excludentes de ilicitude em espécie (uma a uma, conforme art. 23 CP):

Como já visto acima, as excludentes de ilicitude excluem o elemento da ilicitude do conceito de crime acarretando, desse modo, em um indiferente penal.

O art. 23, do Código Penal, aduz quais são as hipóteses de situações que poderão ensejar na exclusão do elemento da ilicitude, como já mencionado.

Abaixo, veremos as hipóteses do art. 23, do CP, uma a uma.

3.1 – Estado de necessidade (art. 23, inciso I, do CP e art. 24, do CP):

“Art. 24 – Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

3.1.1 – Portanto, são requisitos do estado de necessidade ter agente praticado o fato salvar-se:

De perigo atual – “que não provocou por sua vontade” e “nem podia de outro modo evitar”;

➜ “Direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se”

3.1.2 – Exemplo de estado de necessidade:

A”, após o trabalho, aguardava ônibus para retornar para sua casa com dezenas de outras pessoas, quando percebeu que dois indivíduos em uma moto estavam realizando um “arrastão”.

O indivíduos já haviam conseguido, mediante violência e grave ameaça, a subtração de vários bens dos passageiros.

Tomado pelo medo, “A” corre e é seguido pelos indivíduos. “A” avista uma casa e adentra na residência para fins de se livrar do assalto.

Podemos dizer que “A” não praticou o crime de invasão de domicílio (art. 150, do CP), pois agiu amparado pela excludente de ilicitude do estado de necessidade (art. 24, do Código Penal).

3.2 – Legítima Defesa (art. 25, do CP):

A excludente de ilicitude da legítima defesa está amparada no art. 25 do Código Penal, possuindo a seguinte redação:

“Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.”

 

Nos termos do art. 25, do Código Penal, será considerada como excludente de legitima defesa a utilização, de meios moderados e necessários, para repelir uma agressão injusta, desde que seja atual e/ou iminente, para proteger “direito seu ou de outrem”.

3.2.1 – Portanto, são requisitos para a configuração do estado de legítima defesa (art. 25, do CP):

➜ Utilização de meios moderados e necessários;

➜ Para repelir agressão injusta, atual e iminente;

➜ Para proteger direito seu (legítima defesa própria) ou de terceiro (legítima defesa de terceiro)

3.2.2 – Exemplo de legitima defesa (art. 25, do Código Penal):

A”, está numa festa quando passa a ser agredido por “B” que acreditava que “A” estava dando em cima de sua namorada.

“A” levou vários socos e chutes e quando estava para receber outro golpe, “A” empurrou “B”, que vem a bater a cabeça, sofrendo traumatismo craniano, tendo suas lesões perdurado por mais de 30 (trinta) dias.

Tal situação configuraria, em tese, o crime de lesão corporal grave art. 129, § 1º, inciso I, do Código Penal.

Porém, ficou mais do que demonstrado que “A” apenas agiu para fins de legítima defesa com utilização dos “meios necessários e moderados” para com o objetivo de “repelir agressão injusta” que estava acontecendo, ou seja, “atual e iminente”, para proteger direito seu (no caso, a integridade física).

3.3 – Estrito cumprimento do dever legal (art. 23, inciso III, do CP):

O legislador não se preocupou de inserir um artigo com o conceito de “estrito cumprimento do dever legal” ou mesmo limites para sua aplicação, o que pode ser um problema no caso concreto.

Desse modo, quem se debruça sobre conceitos e limites do estrito cumprimento do dever legal é doutrina e jurisprudência.

Para que seja reconhecido o estrito cumprimento do dever legal, a doutrina majoritária sustenta que é necessária a existência de um “dever legal” no agir do agente (GRECO, 2013, p. 362).

O exemplo mais comum é o do policial que no estrito cumprimento do dever legal troca tiros com assaltante e este (o assaltante) vem a falecer.

De acordo com o caso concreto, é possível a incidência conjunta entre estrito cumprimento do dever legal e legítima defesa de terceiros. Outro exemplo seria o policial civil que, nos limites legais, cumpre mandado de busca e apreensão.

3.4 – Exercício regular de direito (art. 23, inciso III, do CP):

São situações em que o indivíduo, embora incurso, em tese, em uma figura típica, atua amparado na excludente do exercício regular de direito. Doutrinadores como Rogério Greco (2013, p. 368) e Rogério Sanches (2016, p. 115) entendem a prática de esportes violentos, quando praticados dentro das regras, constitui exercício regular de direito.

Sendo reconhecida a causa excludente de ilicitude (art. 23 CP), estaremos diante de um indiferente penal.

 

4 – Reconhecimento das excludentes de ilicitude (art. 23 CP):

Como já vimos acima, ocorrerá a quebra do conceito de crime quando for reconhecida a incidência de quaisquer das hipóteses do art. 23, do Código Penal.

Mas quando será reconhecida? Sobre o momento do reconhecimento da causa de excludente de ilicitude, dependerá do caso concreto.

4.1 – Em sede de inquérito:

De modo excepcional, sendo hipótese flagrante de fato praticado sob quaisquer das circunstâncias do art. 23, do CP, é possível o arquivamento do inquérito policial, nos termos do art. 28, do Código de Processo Penal – CPP.

Atente-se, que apesar de possível, o arquivamento de inquérito com base em excludente de ilicitude é medida mais do que excepcional, devendo se tratar de situação notória e devidamente comprovada na fase de inquérito.

Assim, caso o Membro do Ministério Público entenda que se trata de causa manifesta de excludente de ilicitude, poderá ordenar o arquivamento do inquérito, nos termos do art. 28, do CPP (Obs.: o pacote anticrime inovou a forma de requerer o arquivamento do feito. Atualmente, a nova redação do art. 28 do CPP está suspensa por força de decisão liminar – veja aqui arquivamento de inquérito).

Mais uma vez, se trata de medida de exceção, pois nessa fase vigora o princípio do in dubio pro societate, pois para o oferecimento da denúncia somente se mostra necessário a existência “indícios mínimos de autoria” e “prova de materialidade” (STJ. HC 611.511/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 06/10/2020, DJe 15/10/2020).

4.1.1 – Quanto aos efeitos da decisão que manda arquivar inquérito policial por atipicidade, extinção da punibilidade ou excludente de ilicitude:

Conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça – STJ, a decisão que manda arquivar o inquérito por atipicidade, causa extintiva de punibilidade e causa excludente de ilicitude faria coisa julgada formal e material. Vejamos:

[…] A par da atipicidade da conduta e da presença de causa extintiva da punibilidade, o arquivamento de inquérito policial lastreado em circunstância excludente de ilicitude também produz coisa julgada material.” (RHC 46.666/MS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 05/02/2015, DJe 28/04/2015).

 

Pois bem, o precedente é de 2015, entretanto no final de 2019, após o pacote anticrime, o art. 28 do CPP ganhou nova redação. Antes, o MP requeria o arquivamento ao Juiz e este homologava. Desse modo, existia uma decisão judicial, mesmo que apenas homologatória.

Ocorre, que atualmente quem arquiva o inquérito é o próprio membro do MP, após revisão de Orgão Ministerial (atualmente a nova redação do art. 28 do CPP está suspensa por decisão liminar). Portanto, não temos mais uma decisão judicial que homologa o arquivamento. Desse modo, nos parece que esse entendimento tende a mudar.

4.2 – Quando for hipótese de absolvição sumária – art. 397, do CPP:

 

As hipóteses de absolvição sumária estão no art. 397, do CPP. Ao receber os autos com a denúncia, o juiz fará um juízo de admissibilidade, devendo verificar a ocorrência de hipóteses de rejeição da denúncia (art. 395, do CPP) ou de absolvição sumária (art. 397, do CPP).

Geralmente, o Juiz realizada tal análise após resposta à acusação, ratificando o recebimento da denúncia ou reconhecendo a ocorrência de hipótese de rejeição ou absolvição sumária.

4.2.1 – Vejamos o art. 397, inciso I, do CPP:

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).”

Portanto, existindo causa de excludente de ilicitude, pode o juiz absolver o réu sumariamente nos termos do art. 397, inciso I, do CPP.

Porém, conforme jurisprudência do STJ, isso somente ocorrerá quando se tratar de nítida situação de excludente de ilicitude. Vejamos:

[..] Embora o art. 397 do Código de Processo Penal autorize a absolvição sumária do réu, tal decisão somente poderá ser adotada ante a manifesta existência de causa excludente de ilicitude ou das demais situações previstas no referido artigo. Caso contrário, havendo dúvidas quanto à tese defensiva, caberá ao Tribunal do Júri dirimi-las. (STJ. AgRg no AREsp 1420950/PB, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 21/02/2020).”

Como já mencionado, nessa fase, isto é, na fase de prosseguimento ou não da ação, vigora o princípio do in dubio pro societate, conforme precedentes do STJ (STJ. AgRg no REsp 1861537/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 16/06/2020, DJe 24/06/2020).

 

4.3 – Absolvição – art. 386, inciso VI, do CPP:

Por fim, também é possível o reconhecimento da causa excludente de atipicidade na sentença proferida pelo magistrado no final da fase de instrução.

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

[…]

VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência;”

Na hipótese do art. 386, inciso VI, do CPP, pode o juiz, com base nas provas dos autos, reconhecer as excludentes de ilicitude (art. 23 CP) sem as limitações das hipóteses anteriores.

Saliente-se, que também é possível a absolvição nos termos do art. 415, inciso IV, do CPP quando for hipótese de crimes de competência do Tribunal do Júri.

5 – Recurso em face da decisão que reconhecer a incidência de qualquer das excludentes de ilicitude:

➜ Da decisão que ordenar o arquivamento do inquérito policial: é possível que o ofendido (ou seu representante legal), no prazo de 30 (trinta) dias, requeira a revisão da decisão ao órgão ministerial competente (art. 28, § 1º, do CPP) – *mais uma vez, redação suspensa*.

➜ Da sentença que reconhece a absolvição sumária do art. 397, inciso I, do CPP: trata-se de sentença terminativa de mérito, portanto o recurso cabível é o recurso de apelação (art. 593, inciso I, do CPP);

➜ Da decisão que absolve o réu com fulcro no art. 386, inciso VI e 415, inciso IV. ambos do CPP: nas hipóteses mencionadas caberá recurso de apelação, nos termos do art. 593, inciso I, do CPP.

6 – Em síntese:

As excludentes são aquelas do art. 23, do Código Penal. Sendo reconhecida quaisquer das excludentes, o elemento “ilicitude” do conceito de crime, tornando o fato, por consequência, um indiferente penal.

São excludentes de ilicitude (art. 23 CP): o estado de necessidade (art. 24 do CP), legítima defesa (art. 25 do CP), estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito.

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Fontes:

GRECO, Rogério. CURSO DE DIREITO PENAL. -15. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013.

CUNHA, Rogério Sanches. CÓDIGO PENAL PARA CONCURSOS: Doutrina, Jurisprudência e Questões de Concursos. – 9ª. ed. revista, ampliada e atualizada. – Salvador/BA: JusPodivm, 2016.

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