Guarda no ECA – art. 33: colocação em família substituta

1 – Como funciona a guarda no ECA?

guarda no ECA

Um tema que talvez cause certa controvérsia é a guarda no ECA (Estatuto da Criança e Adolescente), sobretudo se comparado com a guarda amparada no Código Civil de 2002 – CC/02.

Aqui abordaremos uma das possibilidades de inserção de criança/adolescente em família substituta (art. 28 do ECA).

A guarda no ECA é tratada de modo um pouco mais amplo do que no CC/02, conforme veremos aqui.

Nosso objetivo aqui é destrinchar a guarda, ora amparada no ECA, fazendo, sempre que cabível e necessário, sua diferenciação entre a espécie de guarda prevista no ECA, que tem como fim a inserção em família substituta, com o tipo de guarda previsto no CC/02, que objetiva a regularização da guarda entre os ascendentes.

Boa leitura!

2 – Fundamento Legal – art. 33 do ECA

art. 33 do ECA

Para compreender o instituto da guarda é necessário inicialmente uma leitura do art. 28 do ECA, que trata das modalidades de inserção de criança/adolescente em família do tipo “substituta” (temos um post sobre o aqui AQUI).

A guarda no ECA está em seu art. 33, que possui a seguinte redação:

Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.”

É fato que o art. 33 do ECA e seus parágrafos tratam de modo bem mais abrangentes os requisitos para que se conceda a guarda e as exigências para que alguém seja nomeado guardião de um infante ou adolescente.

O art. 28, do ECA, sustenta que a guarda constitui uma das modalidades de inserção em família substituta, ao passo que o art. 33 do ECA traz as obrigações do guardião, inclusive prevendo, expressamente, o direito de o guardião se opor a terceiros, mesmo os pais.

Assim, na hipótese de guarda no ECA, seu fundamento está no art. 33.

Atente-se, que para que se conceda a guarda não há necessidade de destituição/suspensão do poder familiar.

3 – Diferença da guarda do Código Civil e a guarda amparada no ECA:

Em nosso post sobre guarda compartilhada e guarda unilateral, falamos acerca das divergências entre a guarda do CC/02 e a guarda do ECA.

Em seu âmago, são bem semelhantes, porém sua finalidade é distinta e cabe ao operador do direito identificar qual o fundamento a ser utilizado.

A guarda prescrita no CC/02 está regulada pelo art. 1.583 e seguintes do referido códex.

3.1 -Regularização da guarda dos filhos:

A guarda prescrita no art. 1583 do CC/02 se destina regular e definir a guarda entre os genitores, podendo ser compartilhada (é a regra) ou unilateral.

3.2 – Guarda para inserção em família substituta:

Em sentido diverso, a guarda do ECA é uma das possibilidades de inserção da criança e/ou adolescente em família diversa da sua, isto é, em família substituta.

Na falta e/ou impossibilidade dos genitores da criança ou adolescente será posto(a) em família diversa da sua, também conhecida como “família substituta”.

Em tese, a espécie de guarda do art. 33 do ECA tem como função a regularização da guarda de fato (para fins de adoção e tutela) – § 1º, do art. 33, podendo, contudo, se destinar a outros fins fora da tutela ou guarda, ou seja, apenas para a simples guarda – § 2º, do art. 33 do ECA (convenhamos que de excepcional não tem nada, pois é muito corriqueiro).

4 – Noções gerais sobre a guarda, conforme ECA:

De início devemos depreender que a guarda do ECA possui natureza temporária, pois poderá ser revogada (ou modificada) a qualquer hora, desde que exista motivo idôneo e após oitiva do Ministério Público – art. 35 do ECA.

Muito embora a guarda seja vista muitas das vezes como um procedimento antecedente para fins de tutela e adoção, que tem como intento regulamentar a guarda de fato, esta corriqueiramente é concedida para a família extensa (tios, avós, primos e outros), na falta ou impedido dos pais, apenas para fins de guarda, sem intenção de adoção ou tutela (§§ 1º e 2º, do art. 33 do ECA).

É interessante que muito embora a guarda seja temporária e que sua concessão não acarrete em suspensão ou destituição do poder familiar, enquanto o menor estiver em posse do guardião, este, a criança ou adolescente, também será dependente, para efeitos previdenciários, do guardião (§ 3º, do art. 33 do ECA).

No nosso entender, foi acertada a determinação de equiparação feita pelo § 3º, do art. 33 do ECA.

Isso porque, como já referido acima, a concessão de guarda na forma no § 2º, do art. 33 é muito corriqueira e muitas das vezes apenas resta para aquela criança/adolescente o guardião e caso alguma coisa acontecesse com ele, provavelmente o menor voltaria a ficar desamparado materialmente.

Por tal razão, é importante esse reconhecimento da dependência previdenciária.

Porém, é mais do que necessário destacar que o Superior Tribunal de Justiça – STJ, possui entendimento que a guarda apenas para efeitos previdenciários não é admitida (STJ. REsp 1297881/MG, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/05/2014, DJe 19/05/2014)1.

Por fim, mesmo que a guarda tenha sido deferida para terceiro, isso não exime os pais de prestarem alimentos, fixados em ação de alimentos.

No mais, é possível que os genitores visitem os filhos que estejam sob a guarda de outrem, exceto se existir ordem de natureza judicial em sentido contrário (§ 4º, do art. 33 do ECA).

Veja, a guarda do art. 33 do ECA é medida de exceção e temporária. Pode ser que no caso concreta exista uma situação de rompimento dos laços familiares com a dita “família natural” e por conta disso o menor foi posto em família do tipo “substituta” ou em programa de acolhimento institucional.

Em situações assim é essencial que se tente o restabelecimento dos laços para que o menor retorne para sua família originária (desde que isso não represente risco a sua integridade moral, física e psicológica).

5 – Concessão de guarda provisória:

É possível a que se defira guarda provisória (exceto em ação de adoção intentada por estrangeiros). Para tanto será necessário que o guardião assine termo de compromisso (art. 32 e § 1º, do art. 33, ambos do ECA).

A guarda provisória pode ser requerida na inicial ou curso do feito (de forma incidental). É necessário demonstrar a existência da tutela de urgência, do art. 300, do CPC/15.

6 – Requisitos para colocação em família substituta – art. 165 do ECA:

O art. 165 do ECA traz alguns dos requisitos que a inicial, que tem como fito a inserção em família substituta deve conter, além, é claro, daqueles do art. 319 do Código de Processo Civil de 2015 – CPC/15. Vejamos:

guarda provisória

Art. 165. São requisitos para a concessão de pedidos de colocação em família substituta:

I – qualificação completa do requerente e de seu eventual cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste;

II – indicação de eventual parentesco do requerente e de seu cônjuge, ou companheiro, com a criança ou adolescente, especificando se tem ou não parente vivo;

III – qualificação completa da criança ou adolescente e de seus pais, se conhecidos;

IV – indicação do cartório onde foi inscrito nascimento, anexando, se possível, uma cópia da respectiva certidão;

V – declaração sobre a existência de bens, direitos ou rendimentos relativos à criança ou ao adolescente.

Parágrafo único. Em se tratando de adoção, observar-se-ão também os requisitos específicos.”

Já vimos que a guarda é um das modalidades para colocação em família substituta, logo a prescrição legal inserida no artigo 165, do ECA, se aplica a esta.

Fontes:

1 (STJ. REsp 1297881/MG, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/05/2014, DJe 19/05/2014);

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