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Crime de violência psicológica – art. 147-B, do CP

crime de violência psicológica

I – Violência contra a mulher é crime! Conheça mais sobre o crime de violência psicológica – art. 147-B do CP

Recentemente, foi introduzido um novo tipo penal, isto é, um novo crime em nosso Código Penal – CP. Trata-se do crime de violência psicológica, ora inserido no art. 147-B do CP. As alterações foram promovidas pela Lei 14.188/2021.

Não é de hoje que o combate a violência em face da mulher vem ganhando destaque no cenário nacional (mesmo que a passos lentos, afinal não basta lei, sendo necessária a sua efetividade).

Podemos inferir sem qualquer receio que o grande marco, melhor, o pontapé inicial que deu maior destaca ao combate a violência em detrimento da mulher foi a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06).

Desde a sua entrada em vigor, várias modificações foram realizadas para ampliar e modernizar a política de combate a violência contra a mulher.

 

A Lei Maria da Penha inseriu em nosso contexto jurídico o conceito de “violência doméstica e familiar contra a mulher” (art. 1º da Lei Maria da Penha), que até então era negligenciado pelos nossos legisladores.

Além das modificações realizadas no Código Penal, a Lei 14.188/2021 também promoveu alterações na Lei Maria da Penha e criou o “programa de cooperação Sinal Vermelho”. Vejamos (art. 1º, da Lei 14.188/2021):

“Art. 1º Esta Lei define o programa de cooperação Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica como uma das medidas de enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher previstas na Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), e no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), altera a modalidade da pena da lesão corporal simples cometida contra a mulher por razões da condição do sexo feminino e cria o tipo penal de violência psicológica contra a mulher.”

Não obstante, aqui analisares o tipo penal agora presente no novíssimo art. 148-B do CP. Vejamos.

II – Violência psicológica agora é crime (art. 147-B do CP):

 

Talvez o delito de violência psicológica em face da mulher tenha causado certa estranheza em algumas pessoas (mesmo em operadores do direito), isso porque muito embora a violência psicológica seja uma das “formas de violência doméstica e familiar contra a mulher” (art. 7º, inciso II, da Lei 11.340/06), a sua ocorrência de modo isolado não constituía crime.

Até então, no máximo, a violência psicológica constituía alguma elementar de algum tipo penal específico ou poderia contar como fator negativo em eventual dosimetria da penal.

Antes de prosseguir, vejamos o art. 7º, da Lei Maria da Penha:

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018)”

Apesar de o inciso II, do art. 7º, da Lei Maria da Penha dispor de um conceito acerca do prática de violência psicológica, não existia (até então) um tipo penal específico prevendo como típica a conduta de violência psicológica de modo isolado.

Na prática, várias condutas degradantes para o psicológico da mulher poderiam ficar apenas na órbita de uma “zona cinzenta” como um indiferente penal.

Exemplo: a vigilância constante, embora fosse violência psicológica não constitua crime de modo isolado (talvez stalking a depender do contexto – porém também é um crime novo).

Logo, agora temos uma gama de condutas que antes quando perpetradas de modo isolado não constituam qualquer crime, muito embora pudessem ser consideradas como violência psicológica.

 

II. I – Elementares do crime de violência psicológica contra a mulher:

Obviamente que o tipo subjetivo é o dolo, logo não se pune a violência psicológica praticada, por exemplo, por omissão culposa. O art. 147-B do CP traz uma série de elementos que merecem o devido destaque.

Vejamos o texto legal do art. 147-B do CP:

“Art. 147-B. Causar dano emocional à mulher que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação:

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave”

II. I. I – Da análise dos elementos:

O caput do art. 147-B do CP é um pouco extenso e toda a sua redação é relevante para a compreensão segura do tipo penal em análise.

De imediato damos ênfase ao termo causar dano emocional”, que pressupõe que a conduta deve ser grave o suficiente ao ponto de prejudicar ou perturbaro pleno desenvolvimento da mulher ora vítima.

De pronto, se percebe que não será toda conduta que ensejará na incidência do tipo penal previsto no art. 147-B do CP.

Conforme redação supra, exige-se certa gravidade apta a acarretar em consequências prejudiciais e perturbadoras para o desenvolvimento da vítima.

 

Quanto ao termo “desenvolvimento”, entendemos que deve ser entendido do modo mais amplo possível, seja o desenvolvimento psicológico, físico e profissional, por exemplo.

Assim, EM TESE, o assédio moral praticado por questões de gênero poderá ensejar no crime violência psicológica.

Além das condutas que perturbem e prejudique o desenvolvimento da mulher, também constituirá violência psicológica passível de repressão penal as condutas que visem “degradar” ou “controlar”, “ações, comportamentos, crenças e decisões” com a utilização de “ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação”

Muito provavelmente, esta segunda parte do caput do art. 148-A do CP será a mais corriqueira no dia a dia, isso porque muito homens ainda insistem na triste e ridícula ideia de que são “donos” da vontade da mulher, seja ela sua filha, namorada ou esposa.

Um exemplo típico seria do esposo/companheiro que impede a mulher de fazer um curso de nível superior por ciúmes. Este seria um exemplo de violência psicológica.

II. III – Da análise probatória

O tipo penal em questão cuida da chamada integridade psicológica da mulher.

O ocorre que o referido tipo penal pode enfrentar como obstáculo preocupante a escassez dos meios provatórios e até mesmo dificuldade para demonstrar a materialidade do crime, pois há a necessidade de apontar a ocorrência de dano relevante apto a acarretar em violência psicológica.

Essa demonstração deverá ser feita por parecer técnico de profissional apto (psicólogo e psiquiatra, por exemplo).

Nesse caso, entendemos que o Poder Público (não o judiciário, mas o Poder Público como um todo) deverá se adequar para manter núcleos de atendimento a mulher vítima de violência com psicólogos ou mesmo psiquiatras.

Já existem órgãos públicos que objetivam atender a mulheres vítimas de violência como o Centros de Referência da Mulher – CRM e Centro de Referência Especializado de Assistências Social – CREAS.

Porém, a oferta é escassa e o judiciário (principalmente no interior) não dispõe de corpo técnico para avaliar tais situações.

 

Assim, há o risco de ao final o acusado ser absolvido por ausência de parecer técnico, afinal a existência de dano psicológico deve restar evidenciado por parecer técnico e traumas de cunho psicológico somente serão devidamente atestados quando realizado o devido atendimento.

Entendemos que um simples atendimento sem acompanhamento posterior não é capaz de demonstrar com segurança a ocorrência de dano psicológico apto a atrair o tipo penal.

Claro que também é possível abstrair a materialidade por meios indiretos (fotos, vídeos, e-mails, mensagens e outros), não estando o Magistrado vinculado ao parecer do profissional.

Porém, a questão não deixa de ser preocupante pela escassez de profissionais habilitados e a disposição do sistema de justiça, afinal mesmo os profissionais de um CREAS ou CRM não tem como função produzir provar para processo judicial, sobretudo de natureza criminal (e talvez sequer tenham a formação complementar adequada).

II. II – Sobre o risco de eventual banalização do tipo penal ou de proteção deficiente

Particularmente, temos certo receio que o tipo penal em questão venha a ser banalizado, isto é, qualquer discussão ou desentendimento (que seja normal e sem a presença de violência ou outros tipos penal) venha a ser interpretado como violência psicológica.

Ante a já citada situação da escassez dos meios de produção de prova direta, é possível que sejam propostas inúmeras ações penais sem a necessária demonstração de materialidade, o que certamente culminará em absolvições (corretas diga-se de passagem), acarretando em uma banalização do tipo penal.

A consequência disso será o descredito da palavra da vítima e do tipo penal.

 

Também poderá acontecer uma desatenção geral ao crime, no sentido de condutas típicas serem deixadas de lado por incapacidade de produção de prova (imagine a mulher sem condições financeiras e que não possui acesso a profissionais habilitados).

Situações assim poderão acarretar em uma proteção deficiente do bem jurídico.

Ambas as situações são gravosas e esbarram na dificuldade de oferta dos meios de produção de prova desse crime em específico.

III. III – A ação penal e pena

Para processamento do delito de violência psicológica, o legislador optou pela regra ao manter seu silêncio acerca do tipo de ação.

Logo, o crime é de ação penal pública incondicionada. A pena mínima prevista é de 06 (seis) meses e poderá alcançar até 02 (dois) anos de reclusão.

Apesar de a pena ser considerada pequena”, a Lei Maria da Penha proíbe a substituição da pena, transação penal e o pagamento apenas de multa, conforme art. 17 da citada lei. Vejamos:

“Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.”

Além disso, temos algumas súmulas do Superior Tribunal de Justiça – STJ que reforçam tal entendimento. Vejamos:

Súmula 536 do STJ:

“Súmula 536 – A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. (SÚMULA 536, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/06/2015, DJe 15/06/2015)”

Súmula 588 do STJ:

“Súmula 588 – A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. (SÚMULA 588, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/09/2017, DJe 18/09/2017)”

 

IV – Em síntese:

Em síntese, podemos concluir que se trata de um grande avanço no combate a violência contra a mulher.

Anteriormente, a violência psicológica embora prevista na Lei Maria da Penha, quando perpetrada de modo isolado, não constituía crime.

Agora, após o art. 147-B do CP, a violência psicológica passa a ser tutelada pelo direito penal.

Apesar disso, é necessário o devido cuidado, sobretudo com a demonstração de materialidade, para que se evitar banalizações ou proteção deficiente do bem jurídico.

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