Modelo de ação de alimentos gravídicos – Lei 11.804/2008

1. Alimentos gravídicos e a sua fixação, conforme Lei de alimentos gravídicos:

ação de alimentos gravídicos

Não é nenhuma novidade que a verba alimentícia constitui obrigação dos pais para com os filhos, pois há uma obrigação inerente ao próprio poder familiar. Normalmente, as ações de alimentos são propostas após, normalmente, nascimento da prole, porém é possível que se proponha ação de alimentos gravídicos, isto é, ação para assegurar a assistência alimentícia a prole em desenvolvimento.

Em relação aos alimentos, já falamos aqui sobre sua finalidade. Em que pese se tratar dos alimentos gravídicos, sua função não se distância dos alimentos, pois se busca o resguardo do infante, ou melhor, do nascituro.

Como bem sabemos, o Código Civil de 2002 – CC/02 manda que os direitos dos nascituro sejam resguardados, conforme art. 2º, do CC/02. Vejamos:

“Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.”

Logo, é indiscutível que o seu pleno desenvolvimento deve ser resguardado (veja nosso post sobre o início da personalidade civil). Dada a relevância do tema, no ano de 2008 foi editada, aprovada e sancionada a Lei 11.804, que trata dos “alimentos gravídicos”.

A legislação supra leciona que os alimentos gravídicos abarcam (art. 2º, da Lei de Alimentos Gravídicos):

“Art. 2º Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.

Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.”

Portanto, quanto aos alimentos do tipo “gravídicos”, existe vasta legislação, doutrina e jurisprudência são uníssonas em reconhecer sua possibilidade.

2 – Procedimento: da ação de alimentos gravídicos

Quanto ao procedimento e rito, esta modalidade de ação seguirá o rito disposto na Lei 5.478/1968 (Lei de alimentos), sendo a lei de alimentos gravídicos aplicada de modo supletiva, assim como o Código de Processo Civil de 2015 – CPC/15.

Em síntese, o procedimento é mesmo da ação de alimentos devidos aos filhos já nascidos, o que muda é que no caso é o nascituro, ora representado por sua genitora, é quem os pleiteia.

Obs.: É possível acordo judicial ou extrajudicial nesse sentido, aliás, o ideal é sempre o acordo.

2.1 – Possibilidade de tutela provisória

Naturalmente, é admissível os alimentos de modo provisório (a título de tutela provisória). Em síntese, os alimentos provisórios serão determinados logo no despacho inicial (art. 4º, da Lei de Alimentos).

No mais, para fins de concessão destes, é necessária a presença de indícios seguros (indícios, apenas) da suposta paternidade. No caso dos alimentos gravídicos, a legislação fala que:

“Art. 6º Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.

Parágrafo único. Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.”

Assim, pode ser que no caso concreto o juiz deixe para fixar os alimentos logo no despacho inicial e deixe para decidir após contestação ou no curso da demanda.

Porém, a regra, pelo menos é o que a vivência prática nos ensina, é a cominação dos alimentos provisórios logo nos despacho dada a sua imprescindibilidade.

2.2 – Sujeito passivo e passivo

A doutrina entende que o sujeito ativo dos alimentos gravídicos (litigante que os pede) é o nascituro e não a mãe, por mais que esta conste como titular na ação, o beneficiário é o nascituro, posição essa que é sustentada por Cristiano Chaves, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald (2021, p. 1.343). Seria, por exemplo, a situação que se busca direito alheio em nome próprio.

O Superior Tribunal de Justiça – STJ, contudo, sustenta que a grávida é a titular dos alimentos e, após a ocorrência do nascimento do(a) infante, dar-se-á a conversão da titularidade, independente de requerimento (STJ. REsp 1629423/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/06/2017, DJe 22/06/2017).

São pequenas divergências conceituais que não fazem tanta diferença assim na prática. Afinal, se esse fosse o caso, a demanda seria extinta com o parto e nascimento (com vida) do infante em razão da ilegitimidade, porém não é o que acontece (veremos logo mais).

O sujeito passivo (aquele que será demandado) será o suposto genitor. Atente-se, que a Lei de alimentos gravídicos apenas fala em indícios, prescindindo da presença de certeza.

2.3 – Prescindibilidade de certeza quanto a paternidade

Conforme abordado acima, não é necessária a certeza quanta a paternidade, bastante a mera presença de indícios. Prova da relação, por exemplo, mesmo que eventual.

2.4 – Intervenção do Ministério Público e segredo de justiça

Como se trata de interesse de incapaz, conforme CPC/15, o Ministério Público deverá intervir no feito e acompanhá-lo na integralidade (inciso II, do art. 178 do CPC/15), devendo que o feito tramite em segredo de justiça (inciso II, do art. 189 do CPC/15).

3 – Alimentos gravídicos e a distinção em relação a pensão alimentícia – conversão automática

Não existe diferença prática entre os alimentos gravídicos e os definitivos, exceto quanto ao momento de sua concessão. Tanto é que a legislação, no parágrafo único, do art. 6º, da Lei de alimentos gravídicos, aduz, que ocorrido o nascimento do(a) infante, ocorrerá a conversão dos alimentos do tipo “gravídicos” em alimentos do tipo “definitivos”.

O STJ, no informativo de nº 606, confirmou tal interpretação. Vejamos:

“A ação de alimentos gravídicos não se extingue ou perde seu objeto com o nascimento da criança, pois os referidos alimentos ficam convertidos em pensão alimentícia até eventual ação revisional em que se solicite a exoneração, redução ou majoração de seu valor ou até mesmo eventual resultado em ação de investigação ou negatória de paternidade.” (STJ. REsp 1.629.423-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 6/6/2017, DJe 22/6/2017. Informativo 606).

Portanto, a transformação dar-se-á de modo automático. Caso, após nascimento fique demonstrada que a criança não era, de fato, filha do suposto genitor, será necessária ação de exoneração.

4 – Caso fictício – meramente exemplificativo

alimentos gravídicos

“M”, brasileira, solteira, professora, manteve, durante 01 (um) mês, relacionamento com “H”, brasileiro, solteiro, empresário. Após, pouco mais de mês, “M” contou para “H” que acreditava estar grávida.

H”, após saber disso, passou a ignorar a “M”, seja por mensagens ou ligações. “M” recebeu a conformação da gravidez e, sem reposta de “H”, e com gastos enormes com a gravidez (exames, consultas e alimentação, por exemplo), resolveu procurar um advogado para adotar as medidas cabíveis.

M” foi informada por seu advogado que naquele caso seria possível ajuizar ação de alimentos gravídicos. “M” entregou ao seu advogado, fotos, prints de WhatsApp (fora realizada ata notarial) e a indicação de testemunhas.

5 – Modelo de ação de alimentos gravídicos:

O modelo de ação de alimentos gravídicos ora debatido deve ser visto apenas como um exemplo, pois não abrange todas as situações ou teses. Sempre busque montar a sua peça, alegando todas as teses possível e levando em consideração todas as peculiaridades do seu caso.

5.1 – Endereçamento da peça:

Quanto ao endereçamento, este dependerá das leis de organização judiciária. É comum a existência de varas especializadas em direito de família, ao passo que também é bastante comum a existência de varas únicas e varas de competências comum (mais de uma vara).

5.2 – Valor da causa:

Quanto ao valor da causa, o critério a ser adotado é aquele do inciso III, do art. 292 do CPC, isto é, a soma das 12 (doze) prestações pretendidas pelo autor da demanda.

5.3 – Foro competente:

O foro competente para julgar a ação de alimentos, mesmo os alimentos do tipo “gravídicos”, deve ser aquele da residência de quem os pede, conforme inciso II, do art. 53 do CPC/15.

5.4 – Vejamos o modelo agora:

modelo de ação de alimentos gravídicos

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(ÍZA) DE DIREITO DA ___ª VARA DE FAMÍLIA COMARCA DE ________/UF

 

AÇÃO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS – LEI Nº 11.804/20088

 

M”, brasileira, solteira, professora, portadora do RG de nº XXXXXX, expedida pela XXXXXX e CPF de nº XXXXXXXXX, residente e domiciliada na rua …., nº xxx, bairro xxxxxxx, Cidade, Cep, Cel.: …… e e-mail ….., vem, com o devido respeito e superior acatamento, através de seu advogado XXXXX, formalmente constituído (procuração anexa), com endereço profissional na Rua XXXXXXX, bairro …., Cidade …., Cep …, Cel.: ….. e e-mail xxxxx, onde recebe notificações e intimações, com fundamento no artigo 1566, inciso IV e seguintes do Código Civil, Lei 11.804/2008 e na Lei 5478/68, propor a presente:

AÇÃO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS

Em face de “H”, brasileiro, solteiro, empresário, RG de nº …. e CPF de nº xxxxxx, residente no endereço ….., Cel.: xxxxx, e-mail xxxxx, com base nos fundamentos fáticos e jurídicos a seguir delineados.

I – INICIALMENTE

I. I – DA JUSTIÇA GRATUITA

Inicialmente, a autora roga pela concessão da gratuidade da justiça, pois pode ser vista como presumivelmente hipossuficiente, devendo, nesse interím, ser considerada pobre na forma da lei e assim o sendo, faz jus, na forma do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal de 1988, bem como com fulcro no art. 98 e seguintes do CPC/15, a gratuidade da justiça, tudo conforme declaração de hipossuficiência anexa.

Assim, roga-se inicialmente pelos benefícios da gratuidade judiciária, pois, como já mencionado, enquadra-se na situação legal para sua concessão, nos termos do artigo 98 e seguintes do CPC/15, além do art. 1º, § 2º, da Lei de alimentos.

Não sendo concedida a gratuidade, a pretensão da autora, isto é, o pleito de concessão de alimentos gravídicos poderá ser prejudicado ante a falta de recursos financeiros.

I. II – DO SEGREDO DE JUSTIÇA (art. 189, inciso II, do CPC/15) E INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Como o presente feito versa sobre alimentos, o art. 189, inciso II, do CPC/15 determina que a tramitação ocorra em segredo de justiça para resguardar a intimidade e a vida privada da requerente e do nascituro.

Considerando que a demanda envolve direitos de pessoa hipossuficiente, isto é, de nascituro, é necessária a intervenção do Ministério Público (inciso II, do art. 178 do CPC/15).

I. III – DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO (art. 334, do CPC/15).

Sobre a audiência de conciliação, prevista no art. 334, do CPC/15, os autores informam que têm pleno interesse em sua realização, seja presencialmente ou por meio eletrônico (art. 334, § 7º, do CPC), tudo conforme Lei de alimentos e CPC/15.

II – DOS FATOS

Levar em consideração o caso fictício acima para fins didáticos e melhor compreensão do modelo de ação de alimentos gravídicos. Sempre (sempre mesmo), procure dar ênfase aos fatos relevantes. Seja breve e direto, mas sem deixar de narrar os fatos pertinentes. Seja coerente e sucinto.

III – DO DIREITO – DO DEVER DE PRESTAR ALIMENTOS GRAVÍDICOS

A legislação civil sustenta que aos pais cabe o sustento dos filhos, motivo pelo qual os filhos podem pleitear a concessão de alimentos em face dos pais. No caso dos descendentes menores, existe a presunção legal absoluta da necessidade dos alimentos.

O mesmo se aplica ao caso dos alimentos gravídicos, isto é, aqueles que serão concedidos a mulher que esteja gestando para fins de resguardo da saúde e pleno amadurecimento do nascituro.

Art. 1º Esta Lei disciplina o direito de alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido.”

Os alimentos gravídicos, conforme Lei 11.804/2008, devem ser entendidos como:

Art. 2º Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.

Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.

Os alimentos do tipo “gravídicos” serão fixados sempre que se mostrarem evidenciados a presença de indícios da suposta paternidade, sendo prescindível a ocorrência de certeza.

Assim, considerado as provas anexadas aos autos, sobretudo a ata notarial atestando o teor dos prints da conversa de whatsapp entre a Sra. XXXX e o suposto genitor, é possível depreender que existem indícios suficientes para a concessão e cominação dos alimentos gravídicos.

Sobre o quantum a ser fixado, as despesas médias estimadas alcançam a monta de R$ XXXXXX (XXXX) – liste as despesas.

Portanto, requer a cominação dos alimentos gravídicos nas monta de R$ XXXXX, XX (XXXXX), inclusive que sejam fixados logo no despacho inicial, conforme art. 4, da Lei de Alimentos.

IV – DOS PEDIDOS

Ante todo o exposto, roga-se:

I – Pela concessão da gratuidade da justiça, nos temos do art. 98 e seguintes, do CPC/15, bem como com fulcro na própria lei de alimentos, tudo conforme declaração de hipossuficiência anexa e fundamentos reproduzidos no “tópico I.I” da exordial;

II – que o presente feito tramite em segredo de justiça, conforme manda o 189, inciso II, do CPC/15, por versar sobre alimentos e que o Ministério Público seja intimado para atuar no feito, conforme art. 178, inciso II, do CPC/15;

III – que seja designada audiência de conciliação nos termos do art. 334, do CPC/15, seja presencialmente ou por meio eletrônico (§ 7º, do art. 334, do CPC/15), em estrita observância ao CPC/15 e a Lei de Alimentos;

IV – que seja determinada a citação do demandando, para responder a presente ação, no prazo legal, bem como, acompanhá-la em todos os seus procedimentos, sob pena de imposição da revelia e seus efeitos, conforme art. 7ª, da 11.804/2008 e Código de Processo Civil de 2015;

V – que sejam fixados alimentos gravídicos, na monta de R$ XXXXX (XXXXX), sendo este o valor que melhor de adequa as necessidades do nascituro e, ao final, sejam revertidos em alimentos definitivos, conforme parágrafo único, do art. 6º, da Lei 11.804/2008;

VI – que o réu seja condenado em custas e honorários advocatícios, nos moldes do art. 85, do CPC/15, na monta de 20% (vinte por cento) do valor da causa.

Protesta provar o alegado por todos os meios de provas admitidos em direito, notadamente, depoimento pessoal do requerido, sob pena de confesso, oitiva de testemunhas, juntada ulterior de documentos, bem como quaisquer outras providências que V. Exa. julgue necessária à perfeita resolução do feito, ficando tudo de logo requerido.

Dá-se à presente causa, apenas para efeitos fiscais, o valor de R$ XX.XXX,XX (XXXXXXXXX).

Nestes termos, pede e espera deferimento.

Local/UF, data.

Advogado

OAB/UF de nº…

Bibliografia:

Farias, Cristiano Chaves de. Manual de Direito Civil – Volume Único / Cristiano Chaves de Farias, Felipe Braga Netto, Nelson Rosenvald. – 6. ed. rev, ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2021.

Fontes:

Informativo 606, do STJ

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