Induzir ou instigar alguém a suicidar-se – art. 122 do CP

1 – Art. 122 do CP: é crime induzir ou instigar alguém a suicidar-se

Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça

O delito ora presente no art. 122 do Código Penal – CP, isto é, “Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça” é do tipo “doloso contra a vida” e conforme inciso XXXVIII, do art. 5º, da Constituição Federal de 1988 – CF/88 e § 1 º, do art. 74 do Código de Processo Penal – CPP, a competência para julgamento será do Tribunal do Júri.

Contudo, a Lei 13.968/19 promoveu profundas modificações na referida figura típica, fazendo inserir uma nova conduta consistente em induzir, instigar ou prestar auxílio para a automutilação.

A automutilação não é um tipo de crime doloso contra a vida, mas sim contra a incolumidade física. Por essa razão, a competência para julgamento será do Juizado Especial Criminal ou da Justiça Estadual comum (vai depender do resultado ou da presença de causas de aumento de pena).

O mais correto seria inseri-lo em um tipo penal autônomo no capítulo II, do Título I, do CP (que trata das lesões corporais). Podemos dizer que está “topologicamente” desencontrado no Código Penal.

Particularmente, entendemos que foi um equívoco do legislador inserir o crime de induzir, instigar ou prestar auxílio a automutilação na figura típica do art. 122 do CP, que fica dentro do rol de crimes contra a vida (Capítulo I, do Título I, do CP).

Não obstante, aqui faremos alguns comentários acerca do crime presente no art. 122 do CP e todas as modificações inseridas pela Lei 13.968/2019.

2 – Sobre o delito do art. 122 do CP e o crime de automutilação:

art. 122 do CP

O tipo penal presente no art. 122 do CP dispõe da seguinte redação:

Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça: (Redação dada pela Lei nº 13.968, de 2019)

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. (Redação dada pela Lei nº 13.968, de 2019)”

De pronto, destacamos que as modificações introduzidas pela Lei 13.968/2019 alterou sobremaneira o modo de se interpretar o citado crime.

A pena para o caput, do art. 122 do CP, será, em seu mínimo, 06 (seis) e, no máximo, 02 (dois) anos (sem levar em consideração as causas de aumento de pena).

Em sua redação anterior, o crime seria punido se existisse uma conduta lesiva relevante, fosse a morte (consumação do suicídio) ou ocorrência de lesão corporal de natureza grave.

A ausência de lesão ou a presença de lesões leves constituam fato atípico.

Porém, isso mudou com o novo texto legal do caput do art. 122 do CP, que passou a punir a mera conduta de “induzir ou instigar alguém a suicidar-se”, assim como prestar auxílio no mesmo sentido.

Logo, restará consumado o crime independe da ocorrência de falecimento da vítima ou lesão corporal grave.

Outra novidade foi a inserção da punição do indivíduo que induz ou instiga alguém a automutilação, ou no mesmo sentido presta auxílio material.

Eis uma das críticas do novo art. 122 do CP, pois pode ocorrer uma nítida confusão entre crime doloso contra a vida com uma conduta que na verdade visa reprimir ofensas físicas.

Portanto, seja no suicídio ou mutilação, será punido o agente que:

Induzir: conduta que pode ser entendida como atos e ações que fazem com que o indivíduo ora alvo do inspirador desenvolva uma ideação suicida, uma vontade e desejo anteriormente inexistentes. Outrossim o mesmo se aplica a automutilação.

Instigar: o agente que se propõe a reforçar, “dar fôlego” a sentimentos nocivos e preexistentes no sentido de tirar a própria vida ou automutilação.

Prestar auxílio material: sempre que determinado agente fornece os meios e materiais necessários para o praticar o suicídio ou automutilação. Exemplo: fornece veneno ou navalha para a autolesão.

Não obstante, caso ainda reste dúvida, suicidar-se ou prática de autolesão (automutilação) não são crimes, pois a ofensa ao bem jurídico não extrapola o patrimônio jurídico do suicida ou do indivíduo que vem a praticar autolesão.

Exemplo: “A”, ante uma ideação suicida persistente, decide suicidar-se, porém não os meios usados apenas causam lesões leves. “A” não responderá a crime nenhum.

Porém, quem induz, instiga ou auxilia em tais intentos, qualquer deles, incorrerá na figura típica do art. 122 do CP.

Exemplo: “B” constantemente afirma que “A” é um desgosto e que este deveria se matar, inclusive insinua formas para obter tal fim. “A” vem a tentar o suicídio e da ação resulta em lesões leves. “B” responderá nos modelos do caput do art. 122 do CP.

Por fim, as inovações introduzidas no art. 122 do CP podem impor tratamento diverso a depender do resultado.

Já explanamos acima, que antes da Lei 13.968/2019, que o indivíduo que induzisse, instigasse ou auxilia-se outrem a suicidar-se, mas sem a obtenção de tal fim, sem lesões ou com lesões de natureza leve, o fato seria atípico.

Bem, após a Lei 13.968/2019, a morte, bem como a ocorrência de lesões graves ou gravíssimas, ensejarão em tratamento diverso. Vejamos:

3 – Quando ensejar em lesão corporal do tipo grave ou gravíssima – § 1º, do art. 122 do CP:

O legislador procurou dar tratamento mais severo para quem venha a instigar, induzir ou auxiliar outrem a praticar o suicídio ou a automutilação.

Dentre tais modificações está o § 1º, do art. 122 do CP, que foi inserido com a seguinte redação:

automutilação resultar em morte

Art. 122 […]

§ 1º Se da automutilação ou da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 129 deste Código: (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)”

Assim, nos moldes do § 1º, do art. 122 do CP, a sanção penal na hipótese de suicídio frustrado e da mutilação que acarretem em lesões corporais graves ou gravíssimas, conforme parâmetros dos §§ 1º e 2º, do art. 129 do CP, será de, no mínimo, 01 (um) ano e, no máximo, 03 (três) anos.

Perceba que não é causa de aumento de pena, mas de pena mínima e máxima para a situação do § 1º, do art. 122 do CP.

Exemplo: “A”, toma uma frasco de veneno entregue por “B”, que resolveu ajudar “A” com o suicídio. O veneno não foi ingerido em quantidade suficiente a ponto de matar, porém acarretou em lesões em todo o sistema digestivo que exigiram procedimento cirúrgico e o período de recuperação foi de 06 (seis meses).

Exemplo 2: “A”, que já possuía o hábito de praticar autolesão, foi instigado por “B” a usar um determinado tipo de navalha para conseguir cortes mais profundos. “A” utiliza a navalha indicada na mão, porém atingido nervo de um dos dedos, o que com perdesse o movimento permanente do membro.

4 – Caso o suicídio venha a se consumar ou da automutilação resultar em morte – § 2º, do art. 122 do CP:

Na situação em que o suicídio vem a se consumar ou mesmo que em decorrência da automutilação a vítima venha a morrer, a pena imposta será de 02 (dois) a 06 (seis) anos, isto é o que se extrai do § 2º, do art. 122 do CP.

Art. 122. […]

§ 2º Se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte: (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)”

A pena mínima e máxima previstas são iguais às da redação originária do art. 122 do CP.

Portanto, se da conduta do indivíduo que tenha instigado, induzido ou prestou auxílio para o suicídio ou automutilação de outrem e desta acarretou em morte, aplicar-se-á o § 2º, do art. 122 do CP.

5 – Situações em que a pena do art. 122 do CP será aumentada – causas de aumento de pena do crime do art. 122 do CP:

O novíssimo texto legal do art. 122 do CP, trouxe, em síntese, três causas de aumento de pena. Vejamos:

Art. 122. […]

§ 3º A pena é duplicada: (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)

I – se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil; (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)

II – se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)

§ 4º A pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitida em tempo real. (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)

§ 5º Aumenta-se a pena em metade se o agente é líder ou coordenador de grupo ou de rede virtual. (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)”

Esses aumentos ocorrem na terceira fase da dosimetria da pena.

§ 3º, do art. 122 do CP – DUPLICAÇÃO DA PENA:

Assim, caso o indivíduo que se proponha a induzir, instigar ou auxiliar em suicídio ou automutilação, a sanção penal será duplicada sempre que: (§ 3º, do art. 122 do CP):

I – “se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil”

II – “se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência”.

Se aplica tanto nas hipóteses do caput como dos §§ 1º e 2º, do art. 122 do CP:

§ 4º, do art. 122 do CP – aumentada em ATÉ O DOBRO:

Conforme § 4º, do art. 122 do CP na prática consistente em induzir, instigar ou auxiliar em suicídio ou automutilação, deverá ser reconhecida o aumento da pena em ATÉ O DOBRO, sempre que perpetrada através da internet, seja por redes sociais, chats ou mesmo ao vivo (live).

§ 5º, do art. 122 do CP – aumenta-se em METADE:

Por fim, o § 5º, do art. 122 do CP, trouxe como corolário o indispensável aumento da pena cominada em METADE sempre (e aqui é uma questão objetiva) que o autor delitivo for “coordenador de grupo ou de rede virtual” que se destine a prática do tipo penal descrito no art. 122, do CP e seus parágrafos.

Exemplo: Grupo de rede social que possui vários membros que são influenciados a cometer automutilação ou são ensinados sobre como praticar a autolesão.

6 – Tratamento diferenciado em razão do resultado e da vítima – §§ 6º e 7º, do art. 122 do CP:

O legislador também cuidou de dar especial atenção as vítimas menores de 14 (quatorze) anos e pessoas com capacidade de discernimento reduzida (incapazes) ou porque teve sua possibilidade de resistência reduzida (pessoa drogada, por exemplo). Vejamos os §§ 6º e 7º:

Art. 122. […]

§ 6º Se o crime de que trata o § 1º deste artigo resulta em lesão corporal de natureza gravíssima e é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime descrito no § 2º do art. 129 deste Código. (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)

§ 7º Se o crime de que trata o § 2º deste artigo é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime de homicídio, nos termos do art. 121 deste Código. (Incluído pela Lei nº 13.968, de 2019)”

Se a ação de induzir, instigar ou auxiliar em suicídio ou autolesão, acarretar em lesão corporal do tipo gravíssima e desde que o ofendido seja menor de 14 (quatorze) anos ou com discernimento ou possibilidade de resistência reduzidos, o fato processar-se-á como sendo o delito presente no § 2º, do art. 129 do CP (crime de homicídio).

Por fim, nos moldes do § 7º, do art. 122 do CP, ante a ocorrência de morte de menor de 14 (quatorze) anos ou pessoa com discernimento ou possibilidade de resistência reduzidos, o crime praticado será o de homicídio (art. 121 do CP).

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